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21 Junho 2024 | Entrevista: Renata Vomero | Texto: Yuri Codogno

Glaucia Camargos defende melhores políticas de estado para indústria audiovisual: "Cinema se faz em longo prazo"

Produtora conversou com o Portal Exibidor e deu seu parecer sobre o atual momento de nossa indústria

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(Foto: Divulgação)

Um dos grandes nomes que atuam na produção cinematográfica do Brasil, Glaucia Camargos é uma das responsáveis por ter levado importantes filmes às telonas e também para as telinhas nas últimas décadas. E nesse momento de uma nova retomada do audiovisual brasileiro, a produtora conversou com o Portal Exibidor e passou seu parecer sobre a atualidade e futuro do setor. 

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Com uma trajetória importantíssima na dramaturgia nacional, Glaucia Camargos é produtora do filme Mallandro — O errado que deu certo (Downtown/Paris), que entrou em cartaz no último dia 13, mas também possui outras importantes produções em seu currículo. Exemplos são: Um Homem Célebre e o documentário Getúlio Vargas - ambos de 1974 e os primeiros filmes de sua carreira -, a minissérie Engraçadinha (1981), Muda Brasil (1985), Jorge, um Brasileiro (1988), Policarpo Quaresma, Herói do Brasil (1988),  O Vestido (2003), Coisa Mais Linda (2005) e Antônio Meneses – A Câmera e o Violoncelo (2010). 

Para o futuro próximo, Glaucia está trabalhando nos filmes Rabo de Foguete, Reminiscências e O Que Será de Ontem, todos em diferentes estágios de desenvolvimento. 

Apesar do ótimo currículo, a produtora ressalta que cada filme possui seu próprio desafio, assim como o setor apresenta diversos obstáculos: “O cinema é um eterno desafio. Cada filme é um protótipo, assim como nós, os seres humanos. Tenho vários projetos para as chamadas ‘telonas’, e mesmo com todas as dificuldades, eu diria que é meu refúgio profissional predileto. O consumo dos filmes mudou e a pandemia acelerou esse novo modelo. A ida ao cinema tende a se estabilizar em uma camada de consumidores, que, assim como eu, tem preferência em viver os filmes nas salas, em que pese o consumo via streaming”.

Entretanto, um dos problemas enfrentados para tentar estabilizar essa ida aos cinemas se encontra na baixa quantidade de complexos e salas que o país tem. Com quase 3,5 mil salas, segundo Anuário da Ancine, o grande problema do Brasil está na péssima distribuição desses espaços. Quase um terço, por exemplo, está em São Paulo, enquanto 11 estados não chegam a ter 50 salas e outros seis não chegam a 100. 

“O cinema brasileiro é forte e potente. [Mas] a atuação dos filmes é muito prejudicada pela falta espaço de exibição; temos pouquíssimas salas. Um pequeno percentual de municípios têm sala de exibição. Uma piada, dada a dimensão do país. Assim como os exibidores, nós produtores nos ressentimos da falta desse espaço. De qualquer forma, aos trancos e barrancos mantemos nossa cara nas telas”, ressaltou Glaucia. 

Além disso, a concorrência com o cinema estadunidense é um dificultador natural, já que é visto como uma disputa irreversível. Mesmo assim, o Brasil se mostra como uma das poucas potências do mundo quando o assunto é produção nacional, ao lado de países como França, China e Coreia do Sul, entre outros. Entretanto, não adianta ter essa vocação natural para o cinema sem que haja uma boa política de estado que auxilie no fomento do setor.

“Somente uma política pública de longo prazo nos levará ao patamar de estabilidade necessária para uma atividade que é estratégica, econômica, social e cultural. Garantir um cinema brasileiro para os brasileiros em uma primeira instância é dever do Estado. Temos como exemplo a França. É aquele velho ditado: ‘querer é poder’. Se o agrobusiness tem fomento estabilizado, por que não nós que alimentamos corações e mentes?”, questionou Glaucia.

Lembrando que anteontem (19), durante evento que aconteceu no Dia do Cinema Brasileiro, o Governo Federal sancionou o retorno da cota de tela para o cinema nacional, considerada uma medida essencial para fortalecimento do mercado. 

O retorno da cota de tela, entretanto, é apenas um passo inicial desse que pode ser o início de um excelente momento para o cinema nacional, com potencial para superar os melhores índices históricos. Mas, para isso, outras medidas são necessárias, como planos de longo prazo, metas, organização e diversificação de vozes, visto que somos um país extremamente plural. 

“Acho que tudo está muito desorganizado. Repito que falta uma análise crítica, um plano de metas, programas de produção que contemplem todas as nossas tendências de produção. Somos diversificados, somos plurais. Vamos produzir todo o tipo de filme, garantindo todas as vozes e a ocupação de espaço nas respectivas telas. Ficar defendendo que se deva produzir esse tipo de filme ou aquele outro, além de ser uma atitude repressora e censora, restringe a expressão cultural do povo. Temos que produzir tudo para todos. Vamos parar de dar tiro no pé”, explicou Glaucia. 

O futuro do setor audiovisual nacional, aliás, depende dessa organização e planejamento detalhado. E um bom exemplo de como a produção brasileira é essencial para que nossa indústria cinematográfica funcione plenamente bem foram os primeiros meses do ano vigente. Entre janeiro e março de 2024, enquanto diversos países sofriam com a ausência de blockbusters de Hollywood, o Brasil se manteve muito bem em decorrência dos filmes nacionais, que voltaram a apresentar resultados que não eram vistos desde antes da pandemia

Mas para que o cinema brasileiro continue em crescimento, Glaucia lembra que, sem encarar o mercado como mercado, não chegaremos a lugar algum: “Só serei otimista quando todos nós que vivemos de cinema possamos dormir sabendo que as linhas de produção estão garantidas e cronometradas e que nós possamos nos planejar. Cinema se faz em longo prazo. Que o acesso à exibição em todas as mídias seja incrementado e normatizado. Não se faz indústria com política de ocasião. Não se planta soja hoje e no dia seguinte se muda para banana”.

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