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07 Dezembro 2023 | Renata Vomero

"O filme é um pequeno fenômeno", diz produtora de "Puan", premiado e sucesso na Argentina

Fundadora da Bubbles Project, Tatiana Leita falou sobre o lançamento e desafios da indústria

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(Foto: Divulgação)

 

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Chega hoje nos cinemas o longa Puan, uma coprodução brasileira com a Argentina, Alemanha e Itália e que vem fazendo sucesso em festivais e no país hermano. Selecionado no Prêmio Goya e reconhecido em San Sebastian, o filme também vem se mostrado um grande sucesso na Argentina, onde já vendeu mais de 150 mil ingressos.

Com mão brasileira da Bubbles Project, produtora encabeçada por Tatiana Leite, o longa chega ao Brasil com distribuição da Vitrine Filmes e apostando já no burburinho internacional para conseguir espaço e visibilidade no circuito comercial, chamando atenção do público cinéfilo e admiradores do cinema independente.

A narrativa acompanha Marcelo (Marcelo Subiotto), um professor de filosofia da Universidade Puan. Para preservar o legado acadêmico de seu falecido mentor, Marcelo entra na competição por uma cadeira na cátedra da instituição pública, concorrendo com outro profissional da área, Rafael, interpretado por Leonardo Sbaraglia. Diante de um contexto político instável, o professor precisa provar para si mesmo e para seus colegas de trabalho que está à altura do cargo. 

O longa é dirigido por María Alché e Benjamín Naishtat  e tem como empresas coprodutoras, além do Bubbles Project,  a Pasto Cine, Pucará Cine e Infinity Hill (Argentina), Kino Produzioni (Itália), Atelier de production (França) e Pandora Film Produktion (Alemanha). Essa grande colaboração também dá força para o lançamento global, que se beneficia dos talentos e espaço de cada um desses países.

O destaque, claro, fica nas mãos da produtora brasileira, liderada por Tatiana Leite, veterana da indústria, já tendo produzido sucessos como Regra 34 e Benzinho, além de já ter trabalho, em diversas ocasiões, em formato de coproduções internacionais, inclusive, com a diretora María Alché.

Conversamos com a produtora que relatou o processo em torno de Puan, o quanto o filme chega com força no circuito após a carreira bem-sucedida em festivais e na Argentina, bem como ele se beneficia das parcerias com outros países, além, claro, de trazer seu olhar sobre o momento atual da indústria brasileira.

Confira a entrevista:

Como tem sido acompanhar a carreira de Puan nos festivais e prêmios pelos quais ele tem passado e ganhado reconhecimento?

A preparação de “Puan” já foi muito especial, porque era a segunda vez que eu estava trabalhando com a diretora María Alché e com a produtora Bárbara Francisco, e a gente repetiu algumas parcerias do primeiro longa. Trabalhamos com a diretora de fotografia Hélène Louvart, francesa, e com a montadora genial brasileira Lívia Serpa. Por isso mesmo, tinha uma sensação familiar na fabricação do “Puan”, que me parece ter revertido para o filme. Acho que o filme expressa todo esse amor e parcerias que foram somadas na construção do filme. E a estreia em São Sebastião foi muito emocionante. Nunca tinha vivido uma recepção tão calorosa para um filme. A gente tem algumas imagens de vídeo do público recebendo a equipe pós-sessão, realmente foi muito emocionante. Para mim, os prêmios são extras, porque o filme por si só já preenche todo um espaço de reconhecimento e satisfação. E uma das coisas mais lindas é estar na sala quando o público vai descobrindo o filme. Isso aconteceu em São Sebastião, aconteceu no Festival do Rio. É simplesmente uma delícia ver as pessoas interagindo com aqueles personagens. Acho que "Puan" segue fazendo uma carreira forte de festivais.  A gente imagina que esse ciclo vai perdurar até meados de 2025.

Qual a importância deste reconhecimento nestes eventos comercialmente para um filme quando ele estreia oficialmente no circuito de cinemas?

Sem dúvidas, como hoje milhares de filmes estão sendo fabricados no mundo inteiro, conseguir que o filme se destaque em um cenário internacional para depois ser considerado ou aguardado nos mercados nacionais é muito importante. Para tal, obviamente é preciso fazer um filme que se destaque por qualidade, interesse e talentos envolvidos. Vejo que esses prêmios de São Sebastião, de alguma forma, anteciparam um interesse ali, por exemplo, no mercado nacional argentino de recepção do filme. Tiveram as primeiras notícias, o filme tá na competição oficial de São Sebastião, depois foi premiado duas vezes no festival. Com certeza, tem um primeiro burburinho das pessoas que consomem, o que ajuda em uma primeira inserção. E aí, evidentemente, vai contar um pouco a possibilidade que o filme tem de crescer em um boca-boca, que foi o que aconteceu na Argentina. O filme é um pequeno fenômeno. Ele foi lançado totalmente de forma independente nos cinemas argentinos, fez mais de 150 mil espectadores e continua lotando salas. É como se fosse a "febre Puan", e isso com certeza é mais fácil de difundir se você tem uma primeira inserção internacional importante. Agora a gente ganhou um reforço, com a indicação dos prêmios Goya, e acho que sustenta ainda mais a vida do filme nos cinemas.

Esta é uma coprodução entre Brasil, Argentina, Itália, França e Alemanhã. De que forma um filme se beneficia deste tipo de colaboração?

No caso do "Puan", sendo majoritariamente um filme argentino, hoje a Argentina tá vivendo uma crise econômica muito grande. Esperamos que o INCAA continue possibilitando a produção de novos filmes argentinos, mas eles estão vivendo um momento de ameaça. Só que as dificuldades financeiras do país fazem com que um filme 100% produzido com financiamento argentino seja quase impossível. No caso do "Puan", além da questão econômica, tem o fato de que os filmes anteriores dos dois diretores tiveram vários países envolvidos, então, havia uma propensão natural de se retrabalhar com alguns dos parceiros. O novo projeto dessa dupla gerou muito interesse internacional, então o filme foi ao Berlinale Co-production Market, onde países diferentes manifestaram um interesse em participar. Acho que os benefícios são muitos, para além do financiamento em si, que, claro, é muito importante. A gente tem técnicos e técnicas vindos de países diferentes para contribuir artisticamente no filme. Nós mesmos, produtores, sempre lemos as versões de roteiro, dando feedbacks, e a mesma coisa nas montagens. Muito interessante porque são visões distintas que com certeza, pros diretores, é interessante receber esses inputs de lugares diferentes. E também em termos de acesso ao próprio mercado nacional de cada um desses países. "Puan" vai ser distribuído comercialmente no Brasil, na França, na Itália e, esperamos também, na Alemanha. Quando eu falei sobre a questão das técnicas é que, por exemplo, o fechamento da câmera, que é um artifício que a gente usa ao longo do filme, é uma técnica que hoje a Itália especificamente tem um estúdio que trabalha isso, laboratórios, enfim. Então quando eu falo da participação de técnicos estrangeiros vindo desses países para contribuir no filme eu falo também de alguns recursos que alguns desses países têm. Eu estou fazendo uma produção portuguesa grande, uma coprodução Portugal-Brasil-França-Romênia, onde a gente filmou em 35mm durante 4 meses na África. Esse filme saía diretamente das filmagens, semanalmente, para a Romênia, que tem laboratórios de revelação super ativos. Então eu acho que a força da coprodução é de fato possibilitar que um filme sonhado por uma ou duas pessoas de um só país consiga se realizado na cooperação de muitos outros.

Quais estão sendo os atuais desafios e gargalos na produção de cinema independente atuais?

A gente está no momento de uma produção muito vibrante, sobretudo no Brasil. Muitos filmes sendo produzidos, que representam lindamente a diversidade do país e, no entanto,  acho que o grande gargalo está na questão da distribuição e do parque exibidor. E, junto com isso, também as estratégias de trazer o público para as salas, que foi muito fragilizada com a presença dos streamings e com a pandemia. Alguns países já conseguiram se recuperar, acho que a França é o maior exemplo, mas acho que os EUA também estão se reerguendo. Especificamente no Brasil é muito importante que se pense nessa cauda longa, formação em todos os sentidos, inclusive de preservação, de distribuição. Acho que isso é muito é crucial. Não adianta estar fazendo filmes incríveis, mas que o público não tem a oportunidade de ver. E é importante amarrar essa cauda longa. Vou trazer um exemplo do "Benzinho", que começa no Festival de Sundance, faz uma carreira internacional belíssima, distribuído em mais de 20 países, e depois faz uma carreira no Brasil no cinemas, simpática, mas muito aquém do que o filme poderia. E vai, finalmente, ao horário nobre da Rede Globo, provando o quanto ele é acessível às pessoas e o quanto ele poderia ter levado mais gente aos cinemas. Enfim, acho que a delicadeza é pensar em políticas de acesso às salas de cinema, porque acho muito incrível que existam formas diferentes das pessoas verem os filmes, que passe por pay-tvs, streamings e televisões abertas, mas a gente não pode esquecer da importância das salas de cinema. Esse é um desafio que está muito ligado ao público. Porque isso é política pública. Na França, a gente vê a atuação do CNC, como é potente nesse lugar. Essas pequenas distribuidoras na França, ao longo da pandemia, receberam uma quantidade de ajuda extraordinária. No final das contas, teve um crescimento de casas distribuidoras durante a pandemia aqui na França.

 

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