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01 Setembro 2023 | Yuri Codogno

"Angela" é um suspiro na conscientização contra o feminicídio

Portal Exibidor conversou com Hugo Prata, diretor do filme que entra em cartaz no próximo dia 7

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(Foto: Divulgação)

Programado para entrar em cartaz na próxima quinta-feira (7), Angela (Downtown Filmes) se inspira nos acontecimentos reais de 1976, quando a socialite Ângela Diniz - após uma tumultuada separação e cessão da guarda dos três filhos - entra em um relacionamento com Raul. Spoilers da vida real: como é de conhecimento público, ela foi assassinada pelo companheiro, se tornando um dos casos de feminicídios mais famosos de todos os tempos.

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O caso é muito conhecido não apenas por envolver uma pessoal do alto escalão social da época, mas por causa da própria trajetória da socialite, que gostava de levar uma vida mais livre, sendo julgada negativamente pela mídia por causa disso. Como resultado, a sociedade era influenciada a ter opiniões sobre Ângela sem nem mesmo conhecê-la, o que pode ser resumido como machismo em sua mais pura essência.

“Nossa intenção foi continuar dando voz a personagens femininos da nossa história recente. E a Ângela Diniz merecia ter sua história contada de um ponto de vista diferente do que foi apresentado nos tribunais pelo advogado do assassino. Sentimos essa necessidade e oportunidade. Essa nova abordagem me parece urgente e justa”, contou Hugo Prata, diretor do filme, em entrevista exclusiva ao Portal Exibidor. 

A declaração dele vai ao encontro de como foi o julgamento real de Raul, que recebeu uma pena branda de dois anos de cadeia, posteriormente sendo preso mais tempo graças a movimentos feministas e pressão social da época. 

Hugo conta que, graças aos documentos daquele momento, por si só o filme apresentou algumas dificuldades em ser concebido: “O maior desafio foi desviar de tudo que foi dito sobre ela a partir do primeiro julgamento, onde a estratégia do advogado do assassino foi de desqualificar a vítima, na tentativa de justificar ter tomado três tiros no rosto e um na nuca”

Com isso, o foco do filme foi apresentar apenas a partir do momento de quando ela conhece o seu futuro executor, demonstrando como a relação caminhou através de abusos e violências até ocasionar no assassinato frio da vítima. Entretanto, não há documentos ou gravações dos acontecimentos reais dentro da casa que viviam, mostrando como era o dia a dia de ambos, fazendo com que o desafio fosse tentar imaginar o que aconteceu durante os meses em que estiveram na residência onde aconteceu o crime.

Segundo reportagem do G1 de março deste ano, em 2022, a cada seis horas uma mulher foi morta no Brasil vítima de feminicídio. Enquanto temos nossa rotina normal, acordando, trabalhando, estudando, curtindo, descansando e finalmente voltando a dormir, quatro mulheres perderam a vida graças ao feminicídio, ou seja, assassinadas por homens em uma situação doméstica e pelas consequências da desigualdade entre gêneros.

Quase 50 anos depois do caso de Angela Diniz, o número de feminicídios continua assustadoramente alto. Desde 2015, quando a Lei do Feminicídio entrou em vigor, o percentual deste crime relacionado ao número de assassinato de mulheres cresceu. Em 2018, ano que houve a primeira medição envolvendo todos os estados, a taxa era de 28,1%, enquanto ano passado a proporção chegou a 35,9%. Em outras palavras, das 3.930 mulheres que foram assassinadas em 2022, 1.410 foram vítimas fatais da violência doméstica ou semelhantes. 

Entretanto, é possível interpretar que, como o número de mulheres assassinadas mantém uma média próxima nos últimos seis anos (entre 3.800 e 4.500), esse crescimento proporcional pode estar ligado ao melhor preparo dos órgãos competentes em registrar corretamente o crime. Mas também é possível considerar o corte expressivo na verba para combate à violência doméstica que ocorreu durante o governo Bolsonaro, segundo as pesquisadoras Debora Piccirillo e Giane Silvestre declararam à mesma matéria do G1. 

Essa digressão sobre o assunto - enquanto deveríamos estar falando sobre o filme - é importante para demonstrar como ter produções que abordam o feminicídio são importantes para a conscientização do tema. 

“Queremos que nosso filme desperte as mulheres e os homens. Relacionamentos abusivos acontecem aos montes, temos ouvido isso a cada sessão do filme. É preciso dar voz e acho que um filme tem esse poder. Quando uma pessoa vê na tela aquilo que viveu ou vivenciou funciona como um ‘clic’”, explicou Hugo Prata. 

Angela está entrando em cartaz em um momento de retomada do audiovisual, onde é possível perceber que diferentes gêneros e narrativas vêm ganhando espaço nas telonas. Hugo ressaltou que é preciso uma conscientização de que o cinema é uma indústria importante na arrecadação de impostos e na formação da identidade cultural de um país: “A maioria dos ataques que sofremos nos últimos anos vieram da total ignorância desses dois fatores. A partir daí, os produtores, a Ancine e os distribuidores estão prontos para levar nosso audiovisual muito além”.

Além da direção de Hugo Prata, Angela conta com o roteiro de Duda Almeida e é uma produção da Bravura Cinematográfica com coprodução da Star Productions. O elenco conta com Isis Valverde interpretando a protagonista, além de Gabriel Braga Nunes, Alice Carvalho, Emilio Orciollo Netto, Bianca Bin, Carolina Manica, Gustavo Machado e Chris Couto.

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