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03 Maio 2023 | Renata Vomero

Sensível e urgente, "A Primeira Morte de Joana" é "ferramenta para discutir cidadania íntima"

Produção é dirigida por Cristiane Oliveira e produzida pela Okna Produções

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(Foto: Divulgação)

Após fazer uma bem-sucedida carreira nos principais festivais por onde passou, levando 11 prêmios neles, incluindo o Festival de Gramado de 2021, é a vez de o grande público conhecer a história de A Primeira Morte de Joana (Lança), dirigido por Cristiane Oliveira e produzido pela Okna Produções.

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O longa tem uma narrativa instigante que mostra a personagem-título lidando com a morte de sua tia-avó ao mesmo tempo em que se intriga por esta nunca ter namorado ninguém. A trajetória a leva a passar por um processo de autoconhecimento por si só também, de amadurecimento.

O roteiro foi escrito por Cristiane em parceria com Silvia Lourenço, para tal ambas trouxeram a tonas memórias pessoas e de pessoas próximas especialmente relacionadas com episódios de descobertas e mudanças do período da adolescência.

“Foi um processo de muita investigação para entender angústias que sentíamos desde a infância. A Silvia e eu conversamos muito sobre isso, como medos são criados pela urgência para definir o que é de um gênero ou de outro já na infância, isso vai tolhendo a expressão natural da criança e, quando chega à adolescência, chegam os questionamentos sobre orientação sexual e uma série de preconceitos”, contou a diretora ao Portal Exibidor.

Aliás, processo este um pouco mais nebuloso e cheio de amarras morais no Brasil do que muitos países estrangeiros que já adotam uma cartilha recomendada pela própria OMS de trazer informações e conhecimento sobre limites do corpo, afeto, sexualidade, respeito ao outro, prevenção, desde a infância até uma maior maturidade, trabalhando tais conteúdos de forma assertiva para cada faixa etária.  

O Brasil não conta com uma cartilha unificada de educação para tratar tais temas nas escolas e há muita polêmica entre pais e educadores sobre como e se é algo necessário trabalhar isso com os jovens. Neste sentido, Cristiane enxerga o filme como uma ferramenta justamente para isso.

“Especialmente porque não existe um conteúdo oficial que sirva de base para os professores de forma ampla e conjunta e isso resulta na deficiência de uma noção de cidadania íntima. A gente espera que o filme possa ser uma ferramenta para discutir justamente cidadania íntima, que é justamente ter consciência dos próprios direitos na vivência da sua intimidade, para que consiga vive-la plenamente sem passar por cima dos limites do outro. Isso não é dado, isso é ensinado”, contou.

Aliás, uma curiosidade que exemplifica a forma como o Brasil trata esse assunto está na classificação indicativa que o filme recebeu por aqui, de 14 anos, enquanto em outros países, como a França, ele foi classificado para todas as idades, até participando de festivais voltados ao público infanto-juvenil.

“Fico com pena porque a gente teve muito cuidado na realização do filme esperando que ele pudesse dialogar com a faixa etária de 12 anos, que é a faixa aspiracional, porque as personagens do filme têm cerca de 13 anos, então, queria que fosse visto por pessoas mais novas, mas aqui não seria possível, porque o jovem de 14 anos nessa relação aspiracional com o conteúdo prefere ver com personagens mais velhos. É uma pena, gostaria muito que a gente pudesse debater mais sobre estes critérios”, ressaltou a cineasta.

Ainda assim, o longa estreia com a possibilidade de levar esta temática tão pertinente para uma grande audiência que talvez não tenha tido a oportunidade de crescer sendo exposta a este tipo de obra audiovisual e que ainda sinta alguns destes pesos trazidos pelas mais diversas fases de amadurecimento e transformação, ou de morte, como o próprio filme metaforiza.

A produção, com isso, embora tenha sido filmada no Rio Grande do Sul, ganha um potencial gigantesco para atingir públicos do mundo inteiro, como sua própria carreira em festivais tem mostrado e a estreia em outros países também.

“Confesso que espero que ele seja um tijolinho na construção de uma trajetória que chegue a um ponto em que não precise mais associar a palavra coragem a questões de expressão de gênero ou sexualidade, que não se precise mais ter medo de ser quem se é, porque é impressionante quanto ele se conecta com diversas culturas”, destacou Cristiane, que ainda contou como o filme impactou pessoas de diferentes nacionalidades durante as exibições e debates em festivais.

O longa portanto chega ao grande público com uma grande expectativa de Cristiane Oliveira e da própria equipe, não só pela estreia comercial em si, mas também pelo filme ter traçado boa parte de seu caminho durante a pandemia no ambiente digital, mas que agora encontra no espaço físico a possibilidade de ecoar as reflexões instigadas pela história de Joana.

“Fico muito feliz que esteja chegando nas salas de cinema e torço para que muita gente possa ver o filme, mesmo quem já viu no online, porque toda a construção sonora em especial ganha outro impacto. O cinema é uma máquina de empatia maravilhosa, ver no online em casa tem muita distração, a experiência é outra na sala de cinema e o som envolve nosso corpo, faz com que a gente perceba detalhes e possa tecer reflexões a respeito do universo dos personagens que as vezes na telinha pequena é mais difícil”, concluiu.

Além de ter sido produzido pela Okna Produções e Aletéia Selonk e ter distribuição da Lança Filmes, o longa teve uma equipe multinacional em várias etapas da produção. O roteiro contou com consultoria do diretor português João Nicolau e dos argentinos Miguel Machalski e Gualberto Ferrari. Cao Guimarães, cineasta e artista visual, participou da fase final como consultor de montagem. A equipe de som traz o uruguaio Raúl Locatelli e a direção de arte teve a colaboração da mexicana Nohemi González – ambos trabalharam no filme “Luz Silenciosa”, do mexicano Carlos Reygadas. A equipe técnica apresenta renomados profissionais gaúchos, como o diretor de fotografia Bruno Polidoro, a montadora Tula Anagnostopoulos e a diretora de arte Adriana Nascimento Borba.

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