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14 Abril 2023 | Yuri Codogno

Poucas salas de cinema e dificuldade em identificar o novo perfil de público são os grandes desafios atuais

Painel "Salas de cinema: a experiência coletiva na era do streaming" ocorreu hoje (14) na Rio2C

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(Foto: Exibidor)

Desde que o streaming surgiu, há debates de como as plataformas podem influenciar nas salas de cinema, mas existe uma imensa dificuldade em chegar num consenso, especialmente por todo ano um novo fato surgir e alterar as conclusões antigas. Por exemplo, a pandemia “decretou” o fim dos cinemas, mas dois anos depois o maior streaming entrou na maior crise de sua história e fez mudar o rumo do setor. Hoje todas as plataformas buscam maneiras de serem autossustentáveis, de lucrar e, em muitos casos, de como dialogar com as salas escuras. Agora são novamente as salas de cinema que estão em foco e a questão é como voltar a atrair o público.

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O painel “Salas de cinema: a experiência coletiva na era do streaming” que ocorreu hoje (14) na Rio2C, em seu último dia de Conferência, debateu exatamente como valorizar tal experiência e o que o setor, tanto como indústria quanto em políticas públicas, pode fazer para acelerar a retomada.

Estiveram presentes no painel Adriana Rattes, Diretora Executiva do Grupo Estação; Monica Portella, Diretora de Marketing e Vendas da Rede UCI; Simone Oliveira, Head da Globo Filmes; e o moderador Mauricio Hirata, Diretor de Investimentos da RioFilme.

Em um primeiro momento, Adriana justificou o porquê de o cinema não ter acabado: “O futuro é uma mistura de tudo aquilo que todo mundo acredita, fora que o cinema tem muito tempo e já passou por muitas mudanças tecnológicas, passou por muitas mudanças de hábito e sempre foi capaz de reinventar. O cinema que eu digo são as salas de cinemas, mas a própria indústria como um todo sempre foi capaz de se reinventar. E a gente vai simplesmente fazendo isso para, de um lado, fortalecer a indústria do audiovisual e, do outro lado, ajudar as pessoas a serem mais felizes”.

Foi consenso entre todas as palestrantes que 2023 será o primeiro ano que poderemos começar a comparar com 2019, o melhor de nossa história audiovisual. Ainda sim, este ano tende a não se equiparar com o pré-pandêmico, pois depende de questões macroeconômicas do mercado, como o alto custo de vida que influencia no preço elevadíssimo de aluguel, despesa, roupas e afins.

Por não estar na base da pirâmide de necessidades, o cinema costuma ser preterido pelas classes com menos dinheiro nos bolsos. Em um momento de um vago início de recuperação econômica, após anos do dólar pautando preços nacionais, a escolha passa a ser óbvia: ou você paga suas contas ou se entretém. 

E aqui entram os streamings, que durante a pandemia viveram o maior boom de sua história. Mesmo assinando mensalmente os três dos que possuem os maiores catálogos de conteúdos populares (Netflix, HBO Max e Prime Video), o valor mal chega a R$ 100, mesmo preço de duas a quatro pessoas assistirem a uma única sessão no cinema, dependendo do dia e local escolhido. 

Mas mesmo antes da pandemia os streamings estavam fortes e mesmo assim o Brasil teve seu melhor ano nos cinemas, com alguns recordes batidos. O que pode explicar isso é a própria experiência de assistir ao longa nas telonas. “O streaming não é nada mais do que uma TV, que até pode ser uma super TV com um som incrível, mas também não é todo mundo que tem acesso a essa sala particular de cinema em casa. E mesmo que compre um equipamento bom, vai ver em casa com a criança enchendo o saco, com o telefone tocando, disputando quem vai ver o futebol e quem vai ver o filme. É uma experiência completamente diferente”, ressaltou Adriana.

Assim como foi na popularização da televisão, do VHS e do DVD, Adriana destacou que o streaming é mais uma tecnologia que tornou mais acessível o produto audiovisual para todo mundo: “Legal que existe, bom que a gente pode - quando não deu para assistir ao filme nos cinemas - descobrir esse filme depois, mas experiência de cinema ainda é única”.

E é aqui que entram os desafios atuais, como a ausência de salas de cinema. “O pessoal vê filme em celular porque não tem acesso à sala de cinema. Se tiver salas na periferia, no interior, se os preços forem razoáveis, claro que as pessoas vão ver nos cinemas. O Brasil tem poucas salas de cinema e isso impacta o acesso, preço e até mesmo os filmes brasileiros”, desabafou Adriana.

Outra questão que veio à tona foi sobre identificar o perfil de quem vai ao cinema desde o fim da pandemia e descobrir o que esse público deseja assistir. Aliás, a mesa concordou que o perfil sempre vai mudando de tempos em tempos. Atualmente, por exemplo, há uma clara preferência (ao menos no Brasil) por longas de terror. Mas questões como idade também são importantes para a identificação do novo público: “No Estação, quem voltou para o cinema foram os jovens. Antes, era um público de mais idade e continuam por lá. Aí vieram os jovens, que já era um trabalho que estávamos fazendo em 2018. Na questão dos jovens, a gente percebeu uma sede muito grande de participar de um movimento, de um comportamento diferente, de uma onda. Eles enchem qualquer filme que as característicam sejam esquisito, muito inovador, antigo, terror trash, é filme B, filme alternativo”, contou Adriana. 

A palestrante foi endossada por Simone a Camila, que concordam que o público jovem e até os 50+ estão cada vez mais presentes e quem ainda não retornou é quem está na faixa dos 35 a 50 anos. Isso pode ser explicado pelo momento de vida, por estarem cuidando de filhos, muito atarefados com trabalho e potencialmente estressados pelos últimos anos, visto que foi uma geração bastante afetada pela pandemia.

"A gente quer muito fazer uma pesquisa de mercado que há muitos anos não fazemos - e o perfil mudou muito - para entender o que o público quer ver. Precisamos unir os elos da cadeia para fazermos uma grande pesquisa e entender o que o consumidor quer para levá-lo para essa experiência", sugeriu Simone para contornar o problema da identificação do público. Adriana completou a informação ao dizer que a pesquisa ajudará o setor a sair apenas do conhecimento empírico e das bolhas que cada complexo ou sala de cinema cria.

O que também foi identificado é que uma linguagem mais atualizada e moderna se faz necessária nesse processo: "Se o filme tem uma estrutura de linguagem de narrativa mais conservadora, mesmo que esteja mostrando uma realidade importante com questões sociais, o público já vê com mais resistência. O jovem está com um desejo mais sofisticado, eles querem outras emoções, outras experiências, que não é apenas falar de um assunto, mas como se fala de um assunto”, destacou Adriana.

E claro que a cota de tela para o cinema nacional não foi esquecida. Entretanto também foi lembrado que, sozinha, a cota não irá resolver nenhum problema. "Concordo que tem que vir junto com esse investimento para os lançamentos, então se as políticas não puderem ajudar no investimento para lançamento, o público não vai. E só obrigar o exibidor a programar aquele filme também não adianta, tem que fazer o público saber dos filmes nacionais e fazer filmes de público”, ressaltou Simone. "Tem que pensar em regulação de um monte de outras coisas e estímulos. Tem que pensar em streaming, em como fazer regulação, de janela. Se o sistema todo não tiver funcionando, não vai dar certo”, concluiu Adriana. 

Por fim, a mesa concordou com alguns pontos que poderiam ser feitos para que haja uma mobilização maior com foco na retomada do público, sendo eles: políticas públicas para ajudar a ter cinemas em cidades que ainda não tem; entender que o audiovisual é um sistema que se articula dentro de si; aumentar o diálogo com todos os players do mercado; e um plano governamental de médio e longo prazo para o audiovisual.

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