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05 Abril 2023 | Yuri Codogno

Rio2C 2023: Rafael Lazarini ressalta como o desenvolvimento de um soft power potente pode influenciar na economia brasileira

CEO do principal evento de economia criativa da América Latina conversou com o Portal Exibidor; abertura do Rio2C 2023 será semana que vem

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(Foto: Divulgação)

Consolidado no cenário nacional como o principal evento de economia criativa da América Latina, o Rio2C volta para sua edição de 2023 com o tema soft power como seu norteador. Ainda mais abrangente que suas versões anteriores, o evento deste ano dará mais um passo rumo ao futuro - após a pandemia finalmente enfraquecer - em busca de melhorias para a economia nacional.

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O Rio2C acontecerá no complexo da Cidades das Artes, entre os dias 11 e 16 de abril, e contará com painéis, workshops, pitchings, rodadas de negócios, masterclasses, ativações e experiências imersivas para um público estimado em mais de 40 mil pessoas. O Portal Exibidor irá cobrir o evento presencialmente, focando, como sempre, no mercado audiovisual e especialmente cinematográfico. Antes, porém, tivemos a oportunidade de conversar com Rafael Lazarini, idealizador, fundador e CEO do Rio2C.

O conceito de soft power - ou seja, a maneira como uma nação projeta culturalmente a sua imagem para o resto do mundo - é o tema principal desta edição. “Esse ano entendemos que o soft power era o tema da vez. A gente vem não só numa visão mais macro, geopolítica até, mas a questão do soft power vem ganhando muita força”, comentou Rafael, que acredita que tal medida pode alavancar a economia nacional.

“A gente enxerga o soft power como a ponta do iceberg [da economia criativa], um desdobramento num nível mais macro de o que a gente fala da criatividade como essência, como matéria prima. Hoje a criatividade já é citada como a habilidade mais desejada por recrutadores de todas as áreas. A gente parte desse ponto de vista mais individual e aí vamos para um olhar mais amplo, de indústria. No próprio Brasil [a economia criativa] representa quase 3% da nossa economia”, completou o executivo.

É importante ressaltar que economia criativa não se limita ao setor criativo, mas é algo que pode ser implementado em qualquer segmento do PIB. Por exemplo, uma inovação para melhorar e baratear o processo de fabricação de determinado produto se encaixa na economia criativa. Segundo Rafael, o soft power entra como a melhoria da imagem de nosso país, criando uma verdadeira vantagem competitiva contra outras nações em todos os setores: “O Brasil desenvolver um soft power potente e pungente traz um desdobramento positivo para o agronegócio, para a metalurgia, não só para nossa indústria especificamente criativa. Então é uma visão estratégica”. 

E o momento para isso acontecer pode ser o ideal, visto que o Brasil passou por quatro anos em que a economia e cultura foram sucateadas, em um aparentemente movimento para favorecer acionistas e donos das grandes fortunas. Além disso, a pandemia intensificou os problemas, fazendo com que novas dinâmicas fossem descobertas e passassem a ser utilizadas nos mais diferentes setores.

Em relação ao Rio2C de 2023, Rafael acredita estarem no caminho correto, mas que este ano ainda será um termômetro de como o mercado irá se comportar nesse ainda novo cenário vigente. Entretanto, o CEO destaca que haverão novidades: “Estamos aumentando muito as áreas que o evento abrange, então isso se traduz em conteúdo. A gente está aumentando o número de palcos. Por exemplo, um só de games e um que vai falar de moda, arquitetura e design. A gente está aumentando os pitchings e também lançamos esse ano o pitching creator, o primeiro onde o proponente é um CPF e tivemos muita adesão”.

As expectativas para a atual edição do Rio2C são elevadas. Se ano passado tiveram uma média entre 5 mil a 6 mil pessoas por dia, para 2023 esperam ter um incremento de pelo menos 10% de público. ”As expectativas são as melhores possíveis e tenho certeza que, se não traduzidas as oportunidades de imediato esse ano, com certeza a gente tá se plantando para ter um 2024 muito positivo”, concluiu Rafael. 

Voltando ao soft power, um tema ainda um pouco novo para muitos, vão aqui alguns exemplos de como eles foram aplicados por alguns países através de suas indústrias audiovisuais. Os Estados Unidos há quase um século se posicionam como salvadores do mundo e pioneiros no desenvolvimento; a China vem se colocando como a nova potência mundial, favorecendo seu próprio setor cinematográfico; a França se põe como uma nação de mente aberta, sempre a favor da equidade social; e a Coréia do Sul alavancou-se como uma grande potência tecnológica. Mas há exemplos bastante negativos também, como a Alemanha Nazista recuperando o orgulho da nação através dos trabalhos de Goebbels - e resultando nos crimes e atrocidades já conhecidos. 

Para motivos bons ou ruins, é possível observar como o soft power tem poder para mudar o patamar de uma nação e o Brasil, por sua alta capacidade de criação e inovação, não pode ficar atrás nessa corrida, especialmente agora que o Ministério da Cultura e Ancine estão trabalhando para voltar a serem protagonistas de nosso setor criativo. E vale ressaltar que não são apenas séries e filmes que têm esse poder. Música é um ótimo exemplo e dá para destacar nossa MPB, conhecida no mundo inteiro, e mais recentemente o sul-coreano K-Pop.

O Rio2C 2023 se dividirá em quatro eixos: os Summits, dia 11, marcam a abertura e abordam recortes específicos de programação, como marcas e conteúdo, creator economy, inovação no mundo dos esportes, criptoativos e ativos verdes; Conferência, que se concentra nos dias 12, 13 e 14, aborda em seus painéis temas como audiovisual, música, games, tecnologia, ciência, mídias, marcas, sustentabilidade, arquitetura, urbanismo, moda, artes e futuro do trabalho, entre outros; também entre os dias 12 e 14, a seção de Mercado traz oportunidades como pitchings e rodadas de negócios para criadores, executivos, investidores e startups ao estabelecer a ponte entre profissionais de diferentes setores da indústria criativa; e voltada ao grande público, a Festivalia realiza no fim de semana uma série de atividades, além de palestras, oficinas e masterclasses com grandes nomes da indústria criativa.

Confira na íntegra a entrevista com Rafael Lazarini:

Como chegaram ao tema soft power e por que optaram por ele nessa edição?

Quando a gente faz a reunião de curadoria, a gente escolhe um tema para nortear os trabalhos e isso vale para todos os palcos e todos os temas que cobrimos. E esse ano entendemos que o soft power era o tema da vez. A gente vem não só numa visão mais macro, geopolítica até, mas a questão do soft power vem ganhando muita força. 

A própria Coréia do Sul vem fazendo isso de forma fantástica e vem crescendo muito a percepção e imagem do país através da produção audiovisual e musical. Quem não lembra… todo mundo torcia o nariz para a Kia e para a Hyundai: ”ai, isso é coreano”. É óbvio que a indústria evoluiu junto, mas hoje a imagem é positiva: o que vem da Coréia é entendido como um produto de qualidade. 

Tem outras não tão óbvias, mas igualmente potentes, como a própria Ucrânia, quando o Zelenski usou o soft power dele, da capacidade dele de engajamento e de ele virar um influencer, e acabou sensibilizando o mundo de uma forma mais ampla e até conseguindo apoio para contrapor o poderio bélico da Rússia.

E aí quando estamos restituindo o Ministério da Cultura, a questão das artes, da indústria criativa, da própria cultura voltar a ter um protagonismo, a gente entendeu que esses elementos todos, de fato, fariam sentido debaixo de um tema macro, como o soft power.

Depois de quatro anos de economia e cultura sucateadas, como o Brasil pode usar o soft power para continuar esse início de retomada?

A gente enxerga o soft power como a ponta do iceberg, um desdobramento num nível mais macro de o que a gente fala da criatividade como essência, como matéria prima. Então isso vai desde a perspectiva mais individual e profissional de cada um. Hoje a criatividade já é citada como a habilidade mais desejada por recrutadores de todas as áreas. O indivíduo que não exerce as habilidades criativas - e aí não estamos falando dos profissionais das indústrias criativas, mas de qualquer área - está correndo o risco de ser deixado de lado, de ser preterido por aqueles que têm essas habilidades.

A gente parte desse ponto de vista mais individual e aí vamos para um olhar mais amplo, de indústria. Então as indústrias criativas são uma indústria no mundo. No Reino Unido, chega a quase 9% do PIB; nos EUA é gigantesco, é grande parte do setor da economia americana; e no próprio Brasil representa quase 3% da nossa economia.

Do ponto de vista econômico e de geração de emprego, é um setor pungente, que emprega muita gente, que tem qualificação de mão de obra. Então nesse segundo nível mais macro, falar disso também faz todo o sentido. E aí em um terceiro nível, que é a ponta do iceberg, que é soft power, você consegue posicionar a imagem do país de uma forma muito positiva, criando de verdade uma vantagem competitiva, não só para o setor das indústrias criativas, mas para todos os outros setores. 

O Brasil desenvolver um soft power potente e pungente, traz um desdobramento positivo para o agronegócio, para a metalurgia, não só para nossa indústria especificamente criativa. Então é uma visão estratégica. 

Quais outros setores de nossa economia podem se beneficiar do soft power?

A nossa indústria financeira é muito pungente. Eu lembro que quando fui estudar nos Estados Unidos, me mudei para Los Angeles, em 2006 ou 2007. Aqui no Brasil já se fazia tudo no sistema bancário automatizado. Quando cheguei lá, tomei um susto, porque a gente estava muito à frente dos Estados Unidos no sistema bancário. Lá o pessoal ainda usava cheque pra tudo. Mesmo anos depois, agora falando de 2015, fazer uma transferência da minha conta para a da minha esposa, no mesmo banco, demorava dois dias úteis. Isso no Brasil já era instantâneo. Mas essa percepção [de que o Brasil é muito avançado] não existe.

Acho que temos vários setores da nossa economia, atividades que são extremamente desenvolvidas e profissionalizadas, mas que não têm essa percepção global porque infelizmente não trabalhamos de uma forma tão positiva. A gente tem muito para avançar em vender a imagem do Brasil, se posicionar bem no cenário global e não precisa inventar a roda; usar esse apelo do soft power é um caminho para se vender globalmente. 

Talvez o choque que você sentiu seja por causa da força do soft power dos EUA…

Eles se vendem tão bem, mas quando chega lá: “não é assim?”. Aí fui entender que por uma necessidade, por uma questão de inflação alta, a gente teve que acelerar muito em termos de tecnologia, de ter um sistema bancário muito evoluído. Talvez por essa necessidade - e a maioria das coisas no Brasil acontecem por causa disso - a criatividade está na essência do brasileiro.

O americano tem o “think outside the box” [pensar fora da caixa] e eles são condicionados a pensar nesse modelo, tudo muito planejado. Mas o brasileiro já “nasceu sem caixa”, então às vezes precisa pensar um pouquinho dentro da caixa, planejar mais e estruturar melhor. Mas enfim, essa criatividade que é meio inata do brasileiro aliada à necessidade, faz com que a gente seja muito bom em muita coisa.

Não à toa, na melhor das intenções da palavra, somos os mestres da gambiarra. Aprendemos a lidar com tudo. 

  1. Eu falo também muito dessa questão da gambiarra. Quando a gente fala de cultura maker, eu falo “cultura maker é gambiarra”, a gente faz isso desde sempre, uma solução MacGyver para tudo. 

Agora falando da Rio2C 2023, quais são as novidades?

Quando a pandemia bateu, estávamos a um mês do evento, em 2020, e conseguimos jogar para o online. E em 2021 decidimos não fazer, por entender que esse modelo de live e evento online estava saturado, porque o Rio2C tem um viés de encontro presencial. Já ano passado foi muito potente, até foi o primeiro evento do setor pós-pandemia, mas limitado. Tivemos a autorização para fazer o evento a menos de dois meses do início. Mas teve esse espírito de reunião, do mercado se reencontrar. 

Agora em 2023 está chegando como uma edição completa, que a gente teve tempo para replanejar. Então acho que isso vai se expressar muito na quantidade de participantes de fora, de palestrantes internacionais que estamos trazendo, grandes nomes. Ainda não vamos ver toda a retomada na parte de mercado que gostaríamos, mas a gente tá nesse caminho e acredito que ano que vem a gente volte com muito força na questão do mercado e dos players internacionais que trazíamos.

Estamos aumentando muito as áreas que o evento abrange, que é um dos setores da economia criativa, então isso se traduz em conteúdo. A gente está aumentando o número de palcos. Por exemplo, um só de games e um que vai falar de moda, arquitetura e design e do mercado também. A gente está aumentando os pitchings, criamos um pitching novo que são do editorial, de projetos do editorial para o audiovisual. E a gente também lançou esse ano o pitching creator. Na verdade, os pitchings de área de negócios eram dedicados às empresas, CNPJ para CNPJ, e esse é o primeiro onde o proponente é um CPF. Então se você tem uma obra, um livro, uma ideia, qualquer propriedade intelectual que possa ser desenvolvida, ter um desdobramento, como uma música para um game, um game para um projeto audiovisual, a gente vai ter um espaço para isso lá. E tivemos muita adesão. 

E estamos apresentando também o número de Summits, que o primeiro dia a gente faz uma curadoria com os parceiros, começamos isso com Meio e Mensagem e hoje a gente tem como parceiros de conteúdo a Player One, de games, summit com a Forbes sobre o futuro de capitais, muito focado em ativos verdes e cripto-ativos, um summit com a NWB com os esportes e a inovação dos esportes, e um summit de creator economy com a Play9 (empresa do João Pedro Paes Leme, do comunicador digital Felipe Neto e do ex-Diretor Executivo do Comitê Olímpico do Brasil Marcus Vinícius Freire), muito nesse olhar de entender e aprofundar nesse mercado de influencer.

Aproveitando, como a curadoria foi realizada?

Foi um processo de evolução. A gente reestruturou depois da pandemia nossa área de curadoria e temos um time interno de programação de conteúdo, então definimos o tema macro, nossa bússola, e aí de fato definimos por palco. Então hoje temos 12 palcos e cada palco vamos entendendo a particularidade, cada palco tem uma temática específica, uma abordagem própria. E isso começa a se desdobrar nos temas que a gente acha que são relevantes. E temos uma conversa com cada palco para definir os temas que são mais relevantes para cada área. Aí vamos destrinchando isso dentro dos painéis e da programação.

E aí vamos olhar quem são os melhores participantes, as melhores pessoas no mercado que melhor falam desse tópico específico. É um trabalho de praticamente um ano, muito minucioso, muito detalhado, mas está no cerne do que a gente propõe. O Rio2C tem uma inspiração muito grande no South by Southwest [SXSW] por ser um evento de conteúdo e isso se desdobra para outras áreas.

Por fim, quais são as expectativas para esse ano e o público esperado?

A gente teve ano passado uma média entre 5 mil e 6 mil pessoas por dia, ao longo dos seis dias de evento. Temos expectativa deste ano de ter um incremento de pelo menos 10%. E com relação ao mercado, acho que ainda é difícil mensurar, até porque o evento vem agora no começo do ano, colado no primeiro trimestre. Então até mesmo as questões de política pública de fomento ao setor, de Ancine, que voltam a rodar e tem o mercado em uma expectativa muito positiva. Então estamos plantando e preparando terreno para um ano muito fértil que será 2024. 

Acho que ainda não vamos conseguir ver a mesma pujança de 2019. Então acho que agora vem, de fato, com um cenário muito positivo, porque temos plataformas de grandes empresas, até internacionais, entrando em diversos setores, investindo no Brasil como um grande mercado produtor, um grande mercado consumidor. E aí estou falando de game, da música, do audiovisual e outras áreas. A gente tem uma expectativa sendo construída em termos de posicionamento do novo Ministério da Cultura e das políticas públicas e de fomento ao setor.

No geral, as expectativas são as melhores possíveis e tenho certeza que, se não traduzidas as oportunidades de imediato esse ano, com certeza a gente tá se plantando para ter um 2024 muito positivo.

Até porque estamos em um primeiro ano da nova era pós-pandemia, que mudamos consumo e planejamento e estamos descobrindo e redescobrindo muitas coisas. É como se em 2023 o terreno esteja sendo arado para o futuro…

Também enxergo por aí. Ano passado a gente veio de um impacto, de uma ressaca da pandemia, muita coisa fora de ordem. E agora as coisas começam a assentar. A gente ainda percebe uma ansiedade muito grande, mas já estamos conseguindo fazer um planejamento mais estruturado. Então estamos entrando nessa nova era pós-pandemia, onde com certeza o setor criativo foi um dos mais afetados - se não o mais afetado -, mas que será um dos mais beneficiados dessa grande transformação.

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