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22 Junho 2022 | Renata Vomero

"As pessoas estão propensas a voltar aos cinemas se tiver conteúdo relevante", afirma Gabriel Gurman

CEO da Galeria Distribuidora e codiretor-geral da Diamond Films Brasil falou com o Portal Exibidor

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(Foto: Divulgação)

Tem um filme que não sai da boca – ou teclas – do público desde seu lançamento nos EUA: Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo. Novo sucesso da A24, o longa encontrou o combo perfeito ao agradar crítica e público e estreia nesta semana oficialmente no Brasil pela Diamond Films Brasil, que está com um fenômeno em mãos.

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Trazendo o tema do momento, o multiverso, em uma narrativa que mistura humor, drama, existencialismo, beleza e ação, o longa já é a maior bilheteria global da A24, com US$87 milhões, ainda prestes a chegar em diversos territórios. Um marco para o cinema independente e ainda mais em tempos pandêmicos. Isso tudo, claro, está sendo combustível para aumentar o hype do filme no Brasil e também para o desenvolvimento da estratégia de lançamento da distribuidora no país.

“Conversamos muito com a A24 e eles estavam muito seguros de que o filme poderia ter um desempenho como o que teve nos EUA e que isso ia acabar repercutindo de alguma forma no Brasil e foi o que aconteceu. Muito amparado pela campanha e pelo sucesso espontâneo que teve nos EUA, o filme começou a ser demandado pelo público no Brasil até mesmo antes da gente começar a campanha de lançamento. Isso acabou dando uma certeza para nós que poderíamos investir na campanha, não só no sentido financeiro, mas de tempo, criatividade, trabalho de equipe mesmo, para que a gente conseguisse atender as nossas expectativas que eram de chegar nesse público mais amplo e gerar interesse espontâneo neles”, destacou Gabriel Gurman, CEO da Galeria Distribuidora e codiretor-geral da Diamond Films Brasil.

Com isso, já nas sessões de pré-estreia, que aconteceram a partir de 16 de junho em 50 salas selecionadas, o filme entrou no ranking de dez melhores rendas e público neste fim de semana, com quase 10 mil ingressos vendidos. Agora, o circuito deve se expandir para 100 a 120 salas, ampliando também o perfil geralmente mais segmentado deste tipo de filme, que tende a ficar restrito ao circuito independente. Desta vez, o longa está furando a bolha e já fazendo sucesso nos cinemas de perfil popular ou misto. Mas para isso, existe a necessidade de muita conversa e troca com os exibidores, que estão bem atentos ao sucesso do longa dirigido por Dan Kwan e Daniel Scheinert e com elenco formado por Michelle Yeoh, Stephanie Hsu, Ke Huy Quan e Jamie Lee Curtis.

“Existiu uma demanda por parte dos exibidores para entender o fenômeno. Quando o filme faz essa bilheteria lá fora ainda mais sendo independente, isso começa a chamar a atenção deles. Nossa conversa com eles é nesse sentido de dizer que é um filme diferente, especial, e que por isso mesmo podemos trabalhar nele numa forma diferente do comum. Conseguimos mostrar para eles como estamos desenvolvendo a campanha e a resposta do público também funciona muito bem nesse sentido. Os exibidores, independente de questão pessoal, conseguiram entender que é um fenômeno diferente. Tem exibidor comparando com o que foi Matrix, inclusive”, ressaltou o executivo.

Aliás, a Diamond está sendo responsável por trazer ao Brasil, exclusivamente nos cinemas, alguns dos títulos que justamente estão gerando essas fagulhas no exterior e reverberando entre os espectadores brasileiros, gerando uma demanda interna por eles.

“É sempre um risco, tem filmes e filmes, assim como temos sucessos, temos fracassos. Precisamos aprender dos dois lados, entender como um filme como esse funciona tão bem, ao mesmo tempo em que outros não. De alguma forma isso faz parte do nosso perfil, buscamos filmes que tenham algo de diferente, o público vem consumindo conteúdos muito parecidos e sabemos que ele mudou de hábitos de consumo do audiovisual”, destacou e ainda ressaltou a importância de fazer análises e estudos de mercado para ficar bem munido de um know-how do que melhor funciona e como fazer funcionar, além, é claro, de adotar uma estratégia condizente com o tamanho de cada título.

Ainda assim, apesar de tudo, as dificuldades de recuperação para os filmes independentes são maiores do que comparado aos blockbusters, até eles ainda se mostram incertos na indústria. A questão, para Gabriel, portanto, é manter um olhar atento para entender a demanda do público e entender que ofertando a eles produtos de boa qualidade, haverá um interesse de consumo.

Ainda mais quando falamos desta tradição de franquias e remakes, o que dá aos espectadores a maior vontade e sede de assistir a produções que sejam diferentes e originais, caso de Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo, por exemplo.

“A partir do momento que a gente consegue ter uma curadoria assertiva, não vou dizer que é natural que o público volte, mas a gente vê que, sim, as pessoas estão propensas a voltar aos cinemas se tiver conteúdo relevante. Isso reforça ainda mais o cuidado que temos com curadoria e aquisições, no desenvolvimento de projetos no caso da Galeria Distribuidora, porque o púbico está lá, querendo consumir. Ele não quer consumir só filmes requentados ou campanhas requentadas, quer consumir alguma coisa que seja nova, ousada, diferente e o mercado independente é fundamental nesse processo”, afirmou.

Gabriel Gurman ainda trouxe mais detalhes sobre a atuação da Diamond e da Galeria no mercado, fez balanço do mercado de Cannes e se aprofundou no tema da pirataria sendo um desafio para o segmento independente. Confira a conversa na íntegra:

Sobre Tudo em Todo o Lugar Ao Mesmo Tempo, o filme foi sucesso de crítica e público nos EUA e está sendo bastante comentado no Brasil. Como foi para vocês o processo para trazer o filme para o país e quais são as expectativas?

Quando vi o filme, fui o primeiro de nós a ver, em Los Angeles em sua sessão fechada. Assim como todo mundo, saí bastante impactado, bem surpreso. É difícil explicar antes o que você vai assistir, sem referências, existem filmes tão chocantes quanto, mas tanto na estética, quanto na história, é muito difícil achar um paralelo. Por isso o filme está tendo tanto sucesso e repercussão tamanha. Passado um pouco esse momento do impacto, queria entender com que público ele falava, naquele momento o filme ainda não tinha estreado nos  EUA, mas sabemos da força da A24. Sabemos que o comportamento do público brasileiro é diferente do estadunidense, então a gente entendia que o filme poderia ter um desempenho legal no circuito alternativo, mas tinha potencial para ir além disso.

Conversamos muito com a A24 e eles estavam muito seguros de que o filme poderia ter um desempenho como o que teve nos EUA e que isso ia acabar repercutindo de alguma forma no Brasil e foi isso o que aconteceu. Muito amparado pela campanha e pelo sucesso espontâneo que teve nos EUA, o filme começou a ser demandado pelo público no Brasil até mesmo antes da gente começar a campanha de lançamento. Isso acabou dando uma certeza para nós que poderíamos investir na campanha, não só no sentido financeiro, mas de tempo, criatividade, trabalho de equipe mesmo, para que a gente conseguisse atender as nossas expectativas que eram de chegar nesse público mais amplo e gerar interesse espontâneo neles.

Acho que isso realmente aconteceu ao longo da campanha toda, e ainda estamos vendo isso. Os resultados de pré-estreia foram ótimos, foi a segunda maior média por sessão dos filmes em cartaz. Foram quase 10 mil pessoas e no fim de semana da Parada do Orgulho LGBTQIA+, o público respondeu muito bem, os melhores resultados para o filme foram em cinemas populares ou mistos. O melhor resultado foi no shopping Eldorado, circuito que a gente não destinaria primeiro para este título.

O filme conseguiu passar por cima de uma barreira de circuito alternativo e estourou a bolha e vai estourar ainda mais. A ideia de circuito é de 100 a 120 salas na estreia oficial.

Como tem sido a conversa com os exibidores e a perspectiva de posicionamento no calendário que chegou a afastar outros títulos data?

A gente sabe é que sim, existiu uma demanda por parte dos exibidores para entender o fenômeno. Quando o filme faz essa bilheteria lá fora para um filme independente, isso começa a chamar a atenção deles. Tanto é que as cabines que fizemos para os exibidores, tanto em São Paulo, quanto no Rio de Janeiro, aconteceram por pedido deles. A gente quis fazer, mas também depois almoçar juntos para conversar sobre o que acabaram de ver, porque sabemos que a primeira reação é de susto, de entender como trabalhar o filme. Essa foi a reação que tivemos quando vimos, mas estamos tendo esse tempo todo para elaborar em cima dele. Nossa conversa com eles é nesse sentido de dizer que é um filme diferente, especial, e que por isso mesmo podemos trabalhar nele numa forma diferente do comum. Conseguimos mostrar para eles como estamos desenvolvendo a campanha e a resposta do público também funciona muito bem nesse sentido. Os exibidores, independente de questão pessoal, conseguiram entender que é um fenômeno diferente.  Tem exibidor comparando com o fenômeno que foi Matrix, inclusive.

Por mais que a gente tenha campanha de marketing, depende muito do público, não tem como controlar, como criar um fenômeno, isso você não cria. Se não vem com um buzz, isso não tem como ser fruto do marketing. A qualidade do filme com a assertividade da nossa campanha foram fundamentais para conseguir aumentar ainda mais esse buzz.

Esses elementos vindos da imprensa de ser apontado como o filme do ano, o mais esperado, é um prato cheio para a nossa campanha. O exibidor logicamente percebe isso, não é um blefe da campanha, ele realmente se tornou um fenômeno.

E vocês estão sempre trazendo para o Brasil títulos que funcionam bem no mercado estrangeiro, como tem sido a estratégia de aquisição de vocês?

É sempre um risco, tem filmes e filmes, assim como temos sucessos, temos fracassos. Precisamos aprender dos dois lados, entender como um filme como esse funciona tão bem, ao mesmo tempo que outros não. De alguma forma isso faz parte do nosso perfil, buscamos filmes que tenham algo de diferente, o público vem consumindo conteúdos muito parecidos e sabemos que ele mudou de hábitos de consumo do audiovisual.

Por conta da pandemia e a crise econômica que impacta o setor, a gente realmente olha para cada conteúdo adquirido, muitas vezes antes mesmo de ficar pronto, e a gente consegue mensurar o que o filme tem de diferente, como conseguimos trabalhar ele de uma forma diferente. O próprio Destruição Final, que foi um sucesso naquele momento de pandemia, é um filme que apesar de ser de catástrofe, recebeu 5 estrelas da Folha de S. Paulo, o público não esperava isso de um filme como esse, mas quando assistimos em Berlim sabíamos que ele era bom.

Existem várias pessoas da Diamond trabalhando para isso, a gente pesquisa muito perfil de consumo latino, porque atuamos na região. Não é por acaso que estamos tendo bons resultados dentro do mercado independente, isso é reflexo de todo o trabalho que fazemos de análises, pesquisas e estudos ao longo dos anos. Não só dos nossos filmes, mas de todos os outros, análises de mercado mesmo. É mais consequência do trabalho que estamos fazendo, do que sorte, logico que ela entra, mas é tudo fruto deste trabalho e que envolve todas as áreas.

Sobre aquisições, agora acabou de acontecer Cannes.

Este Cannes para a gente foi o melhor mercado de todos os tempos, adquirimos uma série de títulos respeitando nosso perfil que é muito amplo. Adquirimos filmes que foram premiados na competição oficial, ao mesmo tempo em que adquirimos filmes mais quentes do mercado independente de diferentes gêneros, mas pensando em público grande mesmo. Continuamos apostando forte em aquisições para o cinema, acreditamos no conteúdo que temos  buscado e nesta melhora no setor.

Como sentiram que estava essa edição do evento em termos de oferta e negociações?

Sentimos um mercado muito aquecido por parte dos títulos e muito receoso por parte dos distribuidores, que é compreensível. Para nós, independentes, muito dessa transformação de mercado pode ser interessante, para nós toda essa transformação pode ser bem benéfica. Por isso apostamos em grandes títulos, grandes aquisições, ao mesmo tempo em pequenas pérolas, como Tudo em Todo Lugar..., como foi o caso de A Pior Pessoa do Mundo, foi um sucesso, chegou a 40 mil pessoas, sendo lançado em 20 salas. Conseguimos chegar nisso só na qualidade do filme e boca a boca, entendendo o tamanho dele. É legal a gente trazer esse exemplo, porque é um filme que a gente sabia da qualidade, entendemos seu tamanho e potencial e trabalhamos bem em cima disso com uma campanha assertiva. É o mesmo que estamos fazendo agora, sermos condizentes com o tamanho do filme e o potencial dele, somos uma empresa que realmente faz campanhas muito bem direcionadas independente do tamanho do público, conseguimos entender isso. É o mesmo com relação à programação, nunca vamos pedir um número de salas que seja incompatível ou desnecessário, a gente realmente tenta ser condizente com a realidade e acho que nossos resultados refletem isso.

 

Como analisam o cenário atual para o cinema independente?

É inegável o momento complicado que estamos passando como um todo, ainda mais para o cinema independente, porque vemos uma grande concentração de público em poucos títulos. Mas ao mesmo tempo, não só o resultado de Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo, mas a demanda por ele mostra que o público quer ver bons filmes.  A partir do momento que a gente consegue ter uma curadoria assertiva, não vou dizer que é natural que o público volte, mas a gente vê que sim as pessoas estão propensas a voltar aos cinemas se tiver conteúdo relevante. Isso reforça ainda mais o cuidado que temos com curadoria e aquisições, no desenvolvimento de projetos no caso da Galeria Distribuidora, porque o púbico está lá, querendo consumir. Ele não quer consumir só filmes requentados ou campanha requentadas, quer consumir alguma coisa que seja nova, ousada, diferente e o mercado independente é fundamental nesse processo.

Com todos esses desafios do cinema independente, de que maneira trabalham também com a questão da pirataria, pensando também nos títulos que chegam depois de um tempo no Brasil após sucesso e críticas positivas no exterior?

A pirataria afeta nosso mercado, fazemos um controle bastante rigoroso disso na América Latina, assim que identificamos algum link já corremos para derrubar, estamos conseguindo ter sucesso quanto a isso. Com relação às estreias, a oferta de salas infelizmente aqui nos impossibilita de estrear filmes na mesma data que lá fora, então, a gente tem que entender junto dos exibidores qual a melhor data para cada filme. Para Tudo em Todo o Lugar, a gente queria se distanciar um pouquinho do lançamento americano, porque sabíamos que seria muito forte lá e isso nos ajudaria aqui. Se lançássemos simultaneamente seria apenas um filme com potencial, ainda sem saber do boca a boca que viria, nesse caso estrategicamente fazia sentido distanciar da estreia dos EUA, para que esse buzz fosse sendo criado e aí estreasse com essa demanda que estamos tendo agora. Tanto que a pré-estreia foi praticamente exigida pelo público e o resultado respondeu a isso.

Definimos a data certa, a gente sempre conversa com os exibidores para definir a data de estreia juntos, é importante que seja uma estratégia alinhada em conjunto, para que a gente fique 12 semanas em cartaz como está sendo A Pior Pessoa do Mundo e repita isso em Tudo em Todo o Lugar. Para todos os nossos filmes esse é o trabalho que a gente faz e logicamente tentando monitorar e controlar a pirataria da melhor forma possível.

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