17 Novembro 2021 | Juliane Albuquerque
Players de diferentes elos da indústria discutem retomada do setor
Conversas produtivas sobre o cenário atual do audiovisual marcaram o primeiro dia de palestras da Expocine
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A versão virtual da Expocine 2021 iniciou nesta quarta-feira, dia 17, na sala SPCine com o encontro online de importantes personalidades da área no Brasil e no mundo para pensar e debater vários aspectos da produção, da distribuição e da exibição do audiovisual hoje no país, especialmente neste período de retomada pós-pandemia.
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Uma mesa com um tema essencial para o momento foi realizada pela Exibidor e a Filme B, e intitulada “Uma conversa entre exibidor, produtor e distribuidor”, reunindo três grandes profissionais do mercado: a produtora e CEO da Glaz, Mayra Lucas; Bruno Wainer, diretor da distribuidora Downtown Filmes e André Sturm, diretor do Grupo Belas Artes que reúne o Cinema Petra Belas Artes, a distribuidora Pandora Filmes e o streaming Belas Artes à la Carte.
Mediada pela jornalista Ana Paula Sousa, da Carta Capital, a conversa levantou questões bem relevantes sobre o cenário atual da indústria. Logo no início, Ana Paula pediu para que o trio falasse dos desafios enfrentados por cada um deles nos últimos meses em suas respectivas áreas de atuação. Mayra trouxe o olhar da produção, que teve que paralisar por um grande período durante a pandemia. “Filmamos até 12 de março de 2020 e paramos. Agora todas as produções que ficaram represadas voltaram juntas, então todas as produtoras estão correndo atrás do tempo, o que dificulta para locação de espaços, equipamentos, equipe, formação de elenco, etc. Fora que os orçamentos feitos anteriormente estão todos defasados com a inflação, tudo dobrou de valor”, contou Mayra que hoje está à frente de quatro projetos ao mesmo tempo.
Já Bruno Wainer contou que a Downtown estava com muitos filmes para lançar quando todos os cinemas fecharam, mas agora está voltando com os longas às salas e se mostrou esperançoso com essa retomada. “A pandemia chegou em um momento de final de ciclo, simbolicamente. Setor público estava totalmente paralisado na área, os cinemas fecharam... Como estou nesse setor há muito tempo, já vi nossa roda-gigante descer e subir muitas vezes, então acredito que o nosso setor de audiovisual sempre sobrevive!”.
André Sturm destacou as dificuldades que as salas de cinema passaram e ainda passam para retomar seu público, mas também está otimista com o mercado. “Uma sala de cinema funciona todos os dias e tem muitos funcionários, com o fechamento durante o ápice da pandemia, o cinema foi o mais prejudicado entre as salas de exibição em geral, ele ficou com o estigma de ser perigoso por ser um ambiente fechado. Mas agora a programação está cada vez melhor e acredito que aos poucos as salas vão se recuperar sim! A experiência do cinema é única e muitas pessoas buscam isso, o compartilhamento da experiência”, afirmou.
Ana Paula trouxe ao debate o ‘boom’ das plataformas de streaming durante a pandemia, para que eles refletissem sobre o impacto em cada elo da indústria. Para a área de produção, trouxe muitas possibilidades com séries e filmes, mas há questões a serem resolvidas como Mayra levantou “o modelo de parceria para produção com as plataformas é de comprar a propriedade toda, às vezes tem parte na criação se foi desenvolvido na produtora. Na Glaz a gente vende de ‘porteira fechada’ a produção – o que é bem diferente quando é uma produção que é voltada para o cinema”, explica.
Já Bruno disse que a questão é simples: “mesmo que uma plataforma de streaming remunere bem a produção, nunca será como o faturamento de uma sala de cinema... É uma relação diferente, não tem como. Como se o streaming fosse investimento de renda fixa e o cinema a renda variável”. Ele também destacou a importância dos distribuidores na intermediação da negociação entre as produtoras e os players de streaming para garantir o direito patrimonial das obras. “Tenho negociado licenciamento de algumas produções junto aos streamings. Mas acho que a regulação do setor é essencial para valorizar o conteúdo das produções”.
André concorda com Bruno da importância dos distribuidores no intermédio das negociações. “É essencial para garantir o direito patrimonial. Quando um produtor vai direto, muitas vezes ele vira um prestador de serviço e deixa de ser empresário, só recebe uma taxa e vende a produção”, afirma. Por conta dessas e outras questões, os três acreditam que é preciso pensar em regulação do setor de streaming/VOD no país. Sobre o futuro do audiovisual brasileiros, se mostraram esperançosos com a volta das produções e das salas, mas esperam que a articulação entre poder público e mercado seja aproximada com ações efetivas, políticas públicas e outras ações que estão sendo retomadas também aos poucos.
Relação entre produção e cláusula de inclusão
Ainda no período da manhã da quarta-feira, o Instituto Dona de Si, comandado pela atriz, roteirista e empreendedora Suzana Pires, trouxe um debate muito atual e necessário dentro das produções audiovisuais: a diversidade. Com o tema “Como usar a cláusula de inclusão?”, reuniu profissionais da indústria de Hollywood que foram responsáveis por instituir a cláusula de inclusão no mercado americano, que pouco a pouco vem aplicando em alguns estúdios e produções. Participaram da palestra, além de Suzana, a produtora Fanshen Cox, da TruJuLo Productions e Pearl Street Films, a advogada Kalpana Kotaga e Tasmin Platter.
Suzana apresentou dados nacionais importantíssimos com base em uma pesquisa realizada pelo Instituto Boca a Boca Filmes com base nos 100 maiores filmes brasileiros de 2009 a 2019 para observar a situação do cenário das produções em relação a inclusão de mulheres, pessoas negras e LGBTQIA+ e os resultados são o retrato de muita desigualdade, como por exemplo, em Direção ter 84% de homens e apenas 16% mulheres. E 100% de homens brancos em Direção. Logo após os dados, Fanshen, Kalpana e Tasmin falaram em um vídeo sobre o trabalho que todos vêm realizando nos Estados Unidos para implementar cada vez mais a cláusula de inclusão, dando também dicas práticas para que as produtoras brasileiras sigam esse exemplo. “É preciso incluir as pessoas na prática, desde o elenco, equipe técnica, direção. É um processo longo, que não se resolve da noite para o dia, mas que impacta muitas pessoas de formas diferentes”, afirmou Fanshen.
Impacto social no entretenimento
Outra mesa muito importante relacionada a produção audiovisual, foi realizada pelo BCCC – Brazil California Chamber of Commerce, a “Entretenimento de Impacto Social”, que contou com Fábio Cesnik (CQS/FV Advogados e BCCC - Brazil-California Chamber of Commerce) e Felipe Cusnir, também da BCCC como mediadores e, como convidados para falar sobre a atuação na produção de conteúdo de responsabilidade social, Luana Lobo (sócia-fundadora da Maria Farinha Filmes) e Gabriel Brakin (CEO da Participant Media).
Tanto a nacional Maria Farinha – que há anos atua na produção de entretenimento social e hoje é a líder na área na América Latina –, quanto a Participant Media, que é hoje uma potência e desde a sua fundação em 2004, tem o foco de fazer a audiência refletir, de mobilizar ações para questões fundamentais como clima, justiça social e racial, gênero, entre outras. Luana acredita que com as produções da Maria Farinha pode empoderar e humanizar as histórias. “Há anos compartilho esse sonho de trabalhar como um estúdio de entretenimento de qualidade com foco em gerar impacto positivo social em toda a cadeia”, conta a produtora que há pouco tempo esteve a frente da série “Aruanas”, em parceria com a Globoplay, que é um sucesso de audiência e impacto, repercutindo até na BBC e The Guardian.
A Participant já produziu obras de grande repercussão, como os filmes “Roma”, “Spotlight”, “Contágio”, “Judas e o Messias Negro” e ainda documentários como “American Factory” e “Uma verdade inconveniente”. “Contamos histórias que engajam o público com perspectivas únicas porque acreditamos que é preciso coragem para mudar o coração das pessoas. Temos um conteúdo variado focado em aumentar a conscientização das pessoas em relação a temas essenciais”, contou Gabriel. O impacto de suas produções além de prêmios, está também nos debates que geram na sociedade. “Roma”, por exemplo, acabou sendo responsável pela regulamentação legal de alguns pontos em produção no México.
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