10 Junho 2021 | Renata Vomero
"Tem uma afetividade na pele do brasileiro", diz executivo da Boca a Boca Filmes
Eric Belhassen lança hoje comédia romântica produzida, dirigida e estrelada por ele
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Eric Belhassen fundou há mais de 15 anos a produtora Boca a Boca Filmes e o Instituto de Pesquisa Boca a Boca, ambos pensando em trazer melhorias para o mercado brasileiro, unindo à sua bagagem do potente mercado francês, onde nasceu. Nesta semana, ele ainda lança o filme AmarAção, uma comédia feita sem incentivos fiscais, produzida, dirigida e estrelada por ele mesmo.
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O longa tem no elenco o amigo Caco Ciocler, com quem Eric divide boa parte do tempo de tela. No filme, eles vivem dois homens de meia-idade que se veem com problemas de relacionamento e Eric começa a achar que sua ex-mulher o enfeitiçou.
“Quando você está sofrendo, é mais fácil falar que é algo externo, no caso a magia, ao invés de falar da magia do amor, você fala do amor pela magia. Queria algo leve, porque são temas complicados”, reforçou o executivo, que traz um olhar masculino e aberto sobre o amor.
Além disso, o longa, que foi filmado em 2014, foi mais um que encontrou dificuldades para achar espaço nos cinemas, já que sua data de estreia estava programada para a pandemia. O cineasta não quis esperar mais para lançar e viu no Dia dos Namorados o momento ideal para posicionar a história, que em 30 de junho já estará disponível em VOD.
“Uma vez que retomou, está muito difícil para o filme brasileiro pequeno, porque aqueles títulos que estavam na fila há um ano e meio, vão entrar um atrás do outro. E o exibidor vai querer só esses grandes filmes e dá para entender, porque ele precisa se recuperar. A gente sabe que para o cinema pequeno brasileiro, vai ter que ter muita paciência, eu não tinha como esperar até o fim de ano, achei melhor lançar neste momento intermediário, até porque tem o Dia dos Namorados”, reforçou.
Além do trabalho criativo, Belhassen também está à frente do Instituto de Pesquisa Boca a Boca Filmes, uma ferramenta muito importante para o mercado brasileiro, que ainda é tímido com relação às pesquisas da indústria para encontrar as melhores maneiras de lançar filmes. No entanto, o instituto vem ganhando força à medida que esse olhar mais profissional de consolida.
Agora, então, com a força do streaming e com a multiplicação dos espaços e públicos em que os filmes podem ser lançados, essa necessidade de compreender o mercado, as audiências, os players, se mostra ainda mais necessária. Inclusive, Belhassen planeja fazer uma pesquisa aprofundada para compreender como o público está consumindo em cada janela de exibição disponível.
Talvez essa veia mais metodológica venha da França, uma potência cinematográfica que abraça a pesquisa e utiliza da melhor maneira para os lançamentos. Além disso, a França ensina muito ao Brasil a melhor forma de valorizar seu próprio cinema, como afirma o executivo.
“O cinema francês tem muito a ensinar para nós. Se olhar antigamente, o cinema francês enfrentava essa luta de brigar contra o cinema comercial, de ter que se impor. Felizmente, vieram políticos que colocaram regras e barreiras para que o cinema nacional francês pudesse se expandir. Como um exemplo, na França é proibido fazer propaganda de filme na televisão, porque apenas as majors tem condições financeiras disso, então, seria algo desigual se fosse permitido. Na televisão só entra entrevista, parte editorial”, ressaltou.
Mas como um bom francês apaixonado pelo Brasil e com um grande trabalho de pesquisa de nosso mercado, Belhassen também destaca e muito as nossas particularidades e qualidades, que merecem ser exaltadas, como a nossa diversidade e nossos talentos.
“O espectador brasileiro tem uma versatilidade, é capaz de amar um filme de ação com grandes efeitos, ao mesmo tempo que vai querer ver um drama, um Meu Nome Não é Johnny. A comédia também sempre funciona, que mostra bem nossa cultura. A marca do brasileiro é essa multiplicidade, esse gosto para as coisas simples. Existe também uma paixão pela comédia, o filme mais leve, a perda do Paulo Gustavo foi uma perda muito grande, também por representar isso, foi muito comovente sentir a tristeza do público, como se uma parte da cultura fosse embora com ele. Tem uma afetividade na pele do brasileiro, eu gosto do público brasileiro”, finalizou.
Confira a entrevista completa:
Você dirigiu, produziu e estrelou o AmarAção, como foi esse processo para você?
Foi bem agradável, o produtor, a maior parte do tempo passa no escritório. Nesse caso, foi algo mais na base do “vamos galera”, vamos dar um jeito, com minha tribo, meus amigos. Foi sem patrocínio, sem incentivo, só no final quando ficou pronto que a Ancine apoiou para o lançamento.
O longa foi filmado em 2014, a gente ia lançar em 2019, mas naquele ano foi complicado para o cinema nacional, por causa da estreia de Vingadores, que ocupou muito espaço, então, todo cinema nacional foi abalado. Não sabíamos quando ia conseguir estrear um filme pequeno, depois deixamos para fevereiro de 2020.
Uma vez que retomou, está muito difícil para o filme brasileiro pequeno, porque aqueles títulos que estavam na fila há um ano e meio, vão entrar um atrás do outro. E o exibidor vai querer só esses grandes filmes e dá para entender, porque ele precisa se recuperar.
A gente sabe que para o cinema pequeno brasileiro, vai ter que ter muita paciência, eu não tinha como esperar até o fim de ano, achei melhor lançar neste momento intermediário, até porque tem o Dia dos Namorados.
O filme é contado a partir do ponto de vista masculino, para você, qual é a importância dos homens falarem mais sobre sentimentos?
Foi importante, o Caco é um ator incrível, muito versátil, consegue passar bem as emoções. No filme, os dois protagonistas choram e pronto, não é uma coisa absurda, como a gente fala no slogan do cartaz: desta vez são os homens que sofrem. Mas não fiz pensando em levar sofrimento aos homens, foi apenas mostrando a realidade daquele personagem.
Quando você está sofrendo, é mais fácil falar que é algo externo, no caso a magia, ao invés de falar da magia do amor, você fala do amor pela magia. Queria algo leve, porque são temas complicados.
Como vê a indústria brasileira e sua relação com a pesquisa mercadológica?
O cinema brasileiro chegou num momento em que a indústria se cristaliza, já pegou os moldes necessários para se estruturar, com seus talentos e financiamentos. Está crescendo! Infelizmente a gente chegou a uma paralisação brutal há três anos, que não tem nenhum edital nacional saindo. Isso desestabiliza todo o mercado, ainda bem que tem os grandes produtores que conseguem continuar e trazer um pouco de vida ao mercado e aos profissionais.
Mas, no meu olhar, a gente começou com pesquisa de mercado de forma muito repentina, para ajudar mesmo. Mas pouco a pouco o mercado percebeu que isso era importante, porque no exterior isso é praxe, existem quatro ou cinco empresa de mercado. Não fecha um corte, um pôster, um trailer, sem antes ter feito a pesquisa, para saber se não está gastando dinheiro à toa. Não é para não lançar, mas é para lançar no tamanho certo.
As vezes quando falo para o produtor, ele tem medo que tenha que mudar o filme depois da pesquisa, mas não é isso. A ideia não é essa, quando se lança um filme de autor, por exemplo, no caso do meu filme eu fiz a pesquisa para saber se o que eu queria falar, estava sendo escutado do jeito que eu queria. Porque se faço um filme para passar uma mensagem e as pessoas entendem outra, então tem aí um problema. Seja para o autor, seja para a indústria, precisa ter a certeza de que passou sua mensagem. É melhor ver isso na pesquisa e ajustar o que for preciso.
Você sente que isso faz falta no Brasil?
Eu meço essa falta pelo crescimento do ramo. Nosso trabalho frente a isso cresceu muito. Tem uma necessidade de fazer isso com metodologia, de uma forma bastante profissional, usei a dos EUA, passei um tempo lá para ver como funcionava, quais eram os problemas, início e finais. Para ser algo útil para o lançamento de um filme.
Você é francês, está na França neste momento, quais semelhanças e diferenças você vê entre o mercado francês e o brasileiro?
O cinema francês tem muito a ensinar para nós. Se olhar antigamente, o cinema francês enfrentava essa luta de brigar contra o cinema comercial, de ter que se impor. Felizmente, vieram políticos que colocaram regras e barreiras para que o cinema nacional francês pudesse se expandir. Como um exemplo, na França é proibido fazer propaganda de filme na televisão, porque apenas as majors tem condições financeiras disso, então, seria algo desigual se fosse permitido. Na televisão só entra entrevista, parte editorial.
Isso ajudou muito, hoje o cinema nacional francês corresponde a quase 40% do mercado do país. Do outro lado, no cinema brasileiro existe uma cultura única, uma riqueza de diferentes tradições, por conta do tamanho do país, e isso precisa ser explorado, isso é algo totalmente diferente de outros países, na França contamos sempre o mesmo tipo de história.
Além disso, precisa ter uma união entre produtor, distribuidor e exibidor, porque às vezes parece que há uma luta. É uma cadeia que precisa funcionar. Dá para entender algumas decisões dos exibidores, porque alguns filmes não seguem o perfil daquele cinema. Estão todos na luta, precisamos entender os elementos da cadeia e fazer o nosso melhor. Ser profissional é entender que todo mundo está precisando de todo mundo, mas cada um entendendo como cada um pode se beneficiar. Para ser uma relação de ganho-ganho, para não colocar expectativa onde não deveria colocar ou não colocar onde deveria.
Como você enxerga o mercado neste momento?
Estamos achando novos caminhos, a pandemia mostrou novas necessidade de usar ferramentas que não usávamos antes. O online tem sido ótimo para os eventos porque está aproximando o mundo, mesmo depois mantendo o físico também.
A pandemia fez crescer o streaming. E nossa, ele teve uma sorte, né? Eles estavam lá brigando com o exibidor, forçando entrada no mercado. De repente, pronto: só tem a gente. Foi uma sorte absurda. Aí precisamos trabalhar nisso e fazer essa sorte ser interessante para a gente também.
Isso pode ser importante para o cinema nacional, porque às vezes ficamos pouco tempo no cinema, em menos salas, mas sabemos que temos mais público para alcançar. Se tem esse intermediário entre televisão e cinema, se for uma janela a mais que pode ser uma oportunidade de explorar melhor e chegar mais no público, pode ser interessante.
O fato de ter um espaço infinito, você não tem um número de salas infinito, mas tem esse espaço no streaming. Então, sendo um filme a mais outro a menos, não vai ser tão impactante quanto é no cinema. Talvez o público de televisão olhe para o cinema de uma forma diferente. O público de televisão adora o cinema nacional.
No streaming, as pessoas que têm o costume da televisão, vão ver nesta plataforma, mas verão o cinema nacional de uma forma diferente, porque ali tem algo a mais, mais qualidade, é mais próximo do cinema.
A iniciativa de fazer sala virtual, por exemplo, é muito interessante. Cada distribuidora está abrindo seu streaming, mas o cinema ganha muito com isso. O que acontece é que você multiplica o número de espaço, uma sala custa caro e tem o tamanho reduzido.
Queremos fazer uma pesquisa para entender quem é esse público das salas virtuais, o que ele gosta de ver, se gosta de ir ao cinema ou se é mais da televisão.
Quais peculiaridades você enxerga no público brasileiro?
O espectador brasileiro tem uma versatilidade, é capaz de amar um filme de ação com grandes efeitos, ao mesmo tempo que vai querer ver um drama, um Meu Nome Não é Johnny. A comédia também sempre funciona, que mostra bem nossa cultura. A marca do brasileiro é essa multiplicidade, esse gosto para as coisas simples. Existe também uma paixão pela comédia, o filme mais leve, a perda do Paulo Gustavo foi uma perda muito grande, também por representar isso, foi muito comovente sentir a tristeza do público, como se uma parte da cultura fosse embora com ele. Tem uma afetividade na pele do brasileiro, eu gosto do público brasileiro.
O público quer se ver na tela, quando vê um Tropa de Elite, ele se vê ali. Nós gostamos de ver diretores e roteiristas que entendem e que colocam nossas dúvidas, nossa cultura, nossa alegria na tela, porque a gente se vê junto com eles.
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