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08 Março 2021 | Renata Vomero

As donas das telas: o olhar das exibidoras brasileiras sobre o setor

Reunimos algumas das profissionais da exibição para refletir sobre o mercado

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Camila Calil, Laure Bacqué e Patricia Cotta (Foto: Exibidor)

O Dia Internacional da Mulher é tradicionalmente marcado por homenagens e análises sobre o papel da mulher nos diversos âmbitos da sociedade. No cinema não seria diferente, hoje o Portal Exibidor transformou toda a programação para falar sobre elas e não poderia faltar as exibidoras, as mulheres que comandam as telas do Brasil.

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Convidamos algumas dessas profissionais para fazer um panorama de como é o mercado exibidor brasileiro, seus desafios e também como ele tem lidado com a questão da representatividade feminina na indústria. Tudo isso sob o olhar delas, que atuam na área há anos, estão à frente das tomadas de decisões e buscam formas de tornar o mercado mais plural, mesmo vindas de um setor predominantemente masculino.

Participam deste especial Camila Calil, gerente de marketing do Espaço Itaú de Cinemas, um dos principais cinemas que mesclam blockbusters e cinema de arte na programação; Laure Bacqué, sócia do Reserva Cultural, reconhecido por trazer ao público as novidades do cinema francês, e Patricia Cotta, gerente nacional de marketing da Kinoplex, uma das maiores redes de exibição do país.

 

Confira as entrevistas:

Camila Calil, gerente de Marketing do Espaço Itáu de Cinemas

Qual panorama você faz de seu trabalho na exibição nestes anos de trajetória?

Estou há 5 anos no mercado de cinema. Como uma profissional que atuou praticamente a vida toda no mercado financeiro, um mercado completamente diferente do mercado de entretenimento, os últimos 5 anos foram extremamente ricos, com muitos desafios, aprendizados e crescimento.

Logo nos primeiros anos de cinema, ainda engatinhando no universo exibidor, recebi o desafio de contribuir também para a construção da distribuidora do grupo Arteplex, a Arteplex Filmes, o que me ajudou muito a entender o funcionamento de toda a cadeia (produção, distribuição e exibição) e ampliar a visão que eu tinha da indústria.

Ter a oportunidade de atuar nas duas pontas,  simultaneamente, trouxe uma experiência profissional muito relevante e fortaleceu o desenvolvimento de diversas habilidades.

Quais são os maiores desafios deste meio para você?

Acredito que a pandemia acelerou o processo natural de evolução dos cinemas e a nossa necessidade de olhar com muita atenção para a importância de nunca deixarmos de lado um trabalho que deve ser perene: o de formar plateias.

As novas gerações, que já chegam em um mundo onde o acesso ao conteúdo está no alcance das suas mãos, já ali no celular, precisam estar mais expostas à experiência de imersão do cinema para saberem identificar, reconhecer que essa experiência é insubstituível e que pode sim conviver bem com todos os outros tipos de conteúdo que estão disponíveis em outros meios porque eles são complementares.

Como você avalia a participação feminina no mercado exibidor brasileiro no decorrer dos anos?

Estou há pouco tempo no mercado e apesar de reconhecer que sim, temos muitas mulheres em cargos de liderança no mercado, eu acho que, assim como em outros mercados, estamos em evolução, mas ainda longe do ideal.

Algumas posições de alto nível hierárquico você pode observar que ainda há uma prevalência de profissionais no sexo masculino, como nas áreas de vendas, programação.

É preciso desmistificar a questão que mulher só pode trabalhar em determinadas áreas.

Toda a indústria de cinema se mobilizou nos últimos anos para garantir a inclusão de mais mulheres no mercado e nas telas de cinema, como você enxerga esse movimento?

Necessário, obrigatório e faz parte da nossa evolução como sociedade.

Fico feliz ao perceber que as empresas no geral estão sendo firmemente cobradas para olhar o profissional pela sua capacidade intelectual, competências e habilidades independente do seu gênero, raça, orientação sexual, identidade de gênero.

É preciso trabalhar arduamente pela equidade, para que homens e mulheres tenham realmente iguais oportunidades de desenvolvimento e consequentemente oportunidades de carreira. 

Você tem uma preocupação em trazer para seu cinema mais títulos protagonizados e dirigidos por mulheres, como aqueles com o selo A-Rate de maior representatividade feminina?

O nosso cinema tem justamente como propósito apoiar projetos que proporcionem diferentes visões do cinema e que valorizem e reforcem o nosso compromisso com a democratização da cultura.

Apoiamos muitos projetos com esse propósito, como foi o caso da oficina de roteiro do Mulheres Negras no Audiovisual Brasileiro. A ideia da oficina nasceu do desejo de fortalecer roteiristas negras brasileiras e suas narrativas autorais. Quinze realizadoras negras, de vários locais do país, tiveram a oportunidade de desenvolver seus argumentos em aulas práticas e teóricas.

Fizemos encontros ministrados por um dos mais importantes consultores de roteiro da América Latina, o escritor cubano Eliseo Altunaga. A ação foi uma parceria entre o Espaço Itaú de Cinema e o site Mulheres Negras do Audiovisual Brasileiro. E a nossa distribuidora carrega este mesmo DNA.

Trouxemos muito títulos dirigidos e protagonizados por mulheres de várias nacionalidades como Guaxuma e outras histórias, da diretora alagoana Nara Normande, Pássaros de Verão, co-dirigido por Cristina Gallego, Rainha de Copas, dirigido por May el-Toukhy, Adam, dirigido por Maryam Touzani, e um destaque especial para o documentário Alice Guy Blaché – a história não contada da primeira cineasta do mundo, que também foi dirigido por uma mulher, Pamela B. Green, e resgata o legado de precursora do cinema, reverenciada como a primeira cineasta e roteirista de filmes ficcionais, vista como uma visionária no uso do cronofone de Gaumont para a sincronização de som, colorização, elenco interracial e uso de efeitos especiais, que teve seu trabalho negligenciado pela história.

Por fim, quais foram os filmes e as personagens que fizeram você querer trabalhar com cinema?

Tenho diversos, mas que me vem na cabeça agora: o Frank, de Al Pacino, em Perfume de Mulher, inclusive no meu casamento optei pelo tango ao invés da tradicional valsa e dancei com meu marido Por uma Cabeza, tamanha a nossa paixão pelo filme.

A professora Dora, personagem de Fernanda Montenegro em Central do Brasil, Leigh Anne Tuohy, de Sandra Bullock, em Um Sonho Possível...

Sem contar em todas as fascinantes animações da Disney como Rei Leão, A Bela e a Fera, que fazem a gente se apaixonar pelas telonas desde que se entende por gente.

 

Laure Bacqué, sócia do Reserva Cultural

Qual panorama você faz de seu trabalho na exibição nestes anos de trajetória? 

Nesses últimos 15 anos, como sócia-diretora do Reserva Cultural, meu trabalho foi bem intenso e, para resumir, eu diria que foi um período de muitas batalhas, mas também de muitas conquistas. Exibir filmes pode parecer uma arte simples, mas sabemos que ela é recheada de detalhes, todos importantes. A escolha do conteúdo, a qualidade dos filmes exibidos, para que o público seja presenteado com a melhor seleção na hora de assistir ao filme, sempre foi a minha missão e a dedicação principal do meu trabalho durante todos esses anos.

Passamos pela transformação digital, a redução de janelas e muitas outras mudanças e concorrências.  Nos adaptamos, e o cinema na tela grande continua vivo até hoje. Programo e amo programar as salas de cinema dos nossos dois complexos, São Paulo e Niterói, desde a abertura, conhecendo cada vez mais as expectativas do público, criando novos programas, promoções e eventos variados em torno dos filmes. Com restaurantes, livrarias, cafés, espaços para eventos e bombonière, além da exibição de filmes, o trabalho de administração é diversificado e constante, mas é com muito carinho que, há mais de 15 anos, me dedico ao Reserva Cultural e aos esforços para manter o público fiel aos nossos espaços.

Quais são os maiores desafios deste meio para você? 

O cinema, como muitas áreas da cultura, precisa ser preservado. Esse é o nosso maior desafio. E para isso é fundamental conseguir propor uma programação de filmes de grande qualidade, eclética, e que possa abranger ao máximo de pessoas. Isso Requer um trabalho de planejamento semanal, de análise, reatividade, flexibilidade, rigor e criatividade ao mesmo tempo. Buscando satisfazer cada vez mais o cliente, com coerência na qualidade das opções e ações oferecidas no complexo. Escolher o melhor filme da semana para seu público é um desafio constante. Para que o cliente de cinema continue sempre seduzido pela sétima arte, precisamos ouvi-lo e atendê-lo da melhor forma, ganhando assim sua frequência nas salas, e com a atenção a administração das contas para manter a engrenagem em funcionamento, sem perder a qualidade dos serviços prestados.

Como você avalia a participação feminina no mercado exibidor brasileiro no decorrer dos anos?

Vejo um aumento da participação feminina nesse mercado de exibição.  Sua presença aumenta a cada dia, ou pelo menos se destaca mais. O mercado exibidor requer bastante flexibilidade, com horários tardios e trabalho na operação aos finais de semana, e isso pode explicar que, ainda, a presença feminina nesse setor seja mais limitada, apesar de ter melhorado nesses últimos anos e, com certeza, ter melhorado de maneira muito significativa,  principalmente, nas áreas de marketing e comunicação, por exemplo.

Toda a indústria de cinema se mobilizou nos últimos anos para garantir a inclusão de mais mulheres no mercado e nas telas de cinema, como você enxerga esse movimento? 

Esse movimento é mundial e totalmente válido. Hoje o Brasil tem mulheres cineastas e atrizes de imenso talento, que conseguiram se destacar não só no Brasil, mas também mundo afora nesses últimos anos, como Barbara Paz, recentemente. Mesmo que ganhando cada vez mais espaço, essa participação é ainda uma luta diária, se considerarmos que ainda a participação de mulheres na indústria cinematográfica é inferior à masculina. Então temos que ter paciência e persistência, pois caminho está traçado, já em várias profissões e governos. Vemos que, aos poucos, a percepção está mudando e estamos evoluímos para mais igualdade.

Você tem uma preocupação em trazer para seu cinema mais títulos protagonizados e dirigidos por mulheres, como aqueles com o selo A-Rate de maior representatividade feminina? 

As salas de cinema dependem das aquisições feitas pelas distribuidoras e de suas ofertas semanais. A cada semana a oferta de títulos é grande, e, além da qualidade do filme, buscando sempre equilibro na programação, de forma espontânea, damos tanto espaço a representatividade feminina como masculina. Essa seleção acaba sendo natural, uma vez que, temos hoje muitas cineastas mulheres como, por exemplo, Julia Rezende, com o filme “Depois eu sou louca”, hoje em cartaz nos cinemas.  Percebemos que, filmes feitos por mulheres, ou tratando de assuntos femininos ou ainda com excelentes protagonistas femininas, atraem e fazem muito sucesso nos nossos cinemas. Então podemos dizer que nos Reserva as mulheres são muito bem-vindas e estão bem representadas.

Por fim, quais foram os filmes e as personagens que fizeram você querer trabalhar com cinema?

Muitos atores e atrizes internacionais são incríveis, muitos filmes franceses me emocionaram, mas acho que o filme que posso resumir a grande magia do cinema para mim com a interpretação de Gérard Depardieu, no filme Cyrano de Bergerac. Essa adaptação magistral para o cinema, esse incrível jogo de ator, roteiro, maquilagem, figurinos e música, na época, para mim, tornou esse filme foi muito relevante. Uma mostra do quanto o cinema pode oferecer ao público, grandes emoções e grandes momentos!

 

Patricia Cotta, gerente nacional de marketing da Kinoplex

Qual panorama você faz de seu trabalho na exibição nestes anos de trajetória? 

Nesses 10 anos de mercado, eu sempre busquei estar um passo a frente na evolução do mercado exibidor, pensando sempre em novas possibilidades e formatos para o cinema. Criatividade e inovação são meu exercício contínuo. O mundo muda a cada instante e precisamos acompanhar e, algumas vezes, até se antecipar. Tudo para permitir que todas as pessoas possam viver uma experiência cada vez mais imersiva e mágica, capaz de despertar inúmeras emoções e, até mesmo, uma reflexão sobre seu modo de pensar e agir. É um trabalho imenso, mas absolutamente encantador. É a isso que me dedico e amo o que faço. Isso faz com que o trabalho seja muito mais um prazer do que uma obrigação.

Quais são os maiores desafios deste meio para você? 

Conhecer de perto cada espectador, o que faz ele sonhar, o que torna uma experiência inesquecível, sobre quais temas ele quer refletir, de que forma ele quer viver esse momento de desconexão, essa viagem. Ou seja, o que ele precisa para se desconectar do mundo e imergir em uma nova história contada na tela gigante. E fazer com que essa experiência seja única e acessível a todos, mantendo o crescimento sustentável da empresa. É uma equalização diária e, aqui no Brasil, um trabalho de níveis continentais para que se alcance uma diversidade de universos absolutamente distintos, econômica e culturalmente.

Como você avalia a participação feminina no mercado exibidor brasileiro no decorrer dos anos? 

Me permitam dizer, espetacular. No decorrer desses dez anos de exibição, tive a alegria de trabalhar com mulheres muito especiais, fortes, competentes e verdadeiras guerreiras, que lutam dia a dia pela nossa indústria, com uma paixão que faz você querer ficar nesse trabalho até o seu último dia de vida. Aprendi muito com cada uma delas e mudei muitos conceitos trazidos de outros mercados.

Toda a indústria de cinema se mobilizou nos últimos anos para garantir a inclusão de mais mulheres no mercado e nas telas de cinema, como você enxerga esse movimento? 

Necessário. A equalização de oportunidades para todos é um imenso desafio, uma luta diária. Acolher, valorizar e remunerar um profissional independente do sexo, cor, ideologia ou qualquer outra variável é um longo caminho que todas as indústrias precisam percorrer com respeito e seriedade.

Você tem uma preocupação em trazer para seu cinema mais títulos protagonizados e dirigidos por mulheres, como aqueles com o selo A-Rate de maior representatividade feminina? 

Nós, do Kinoplex, sempre abordamos o tema de inclusão no cinema, não somente no que tange ao universo de mulheres, mas a todos. Tudo que promova inclusão será sempre priorizado por nós. O cinema tem o dever de ser criado, dirigido, protagonizado, operado e desenvolvido de forma igualitária, pois é assim que as pessoas se sentem quando entram na sala escura e se tornam espectadores. Não cabem mais os discursos de que mulheres têm menos dedicação do que os homens, por qualquer razão atribuída ao gênero. Os resultados que conquistamos comprovam que podemos ser executiva, mãe, companheira, amiga e tudo mais que quisermos ser, tudo com a mesma competência e dedicação, e ao mesmo tempo, somos totalmente multitarefa.

Por fim, quais foram os filmes e as personagens que fizeram você querer trabalhar com cinema? 

Nossa, eu sempre adorei ir ao cinema. Vivi muitas histórias no Comodoro, que era pertinho da minha casa. Sempre adorei dançar. Quando era novinha, assisti inúmeras vezes Dirty Dancing, com a doçura e superação de Baby e Grease, com a rebeldíssima Rizzo, que eu amava. Eu também sou fã de Um sonho possível, especialmente a personagem da Sandra Bullok e Histórias Cruzadas, com a Minny e a Aibileen, que expõe o preconceito e a luta das mulheres negras. Mas, trazendo para perto a paixão pelo cinema, não dá para deixar de citar a Shuri, que recentemente encantou a todos em Pantera Negra. Eu faria um filme só para ela.

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