Exibidor

Publicidade

Notícias /mercado / Perspectivas 2021

04 Março 2021 | Renata Vomero

Sócio da Gullane acredita numa sólida consolidação do audiovisual brasileiro no futuro

Fabiano Gullane fez balanço de 2020 e trouxe suas expectativas para 2021

Compartilhe:

(Foto: Exibidor)

Uma das produtoras mais reconhecidas do Brasil, a Gullane Entretenimento, assim como a maior parte dos players do mercado, também foi pega de surpresa pela pandemia do coronavírus no início de 2020.

Publicidade fechar X

No entanto, com diversos projetos já no gatilho do lançamento, a companhia conseguiu acelerar a finalização destes títulos e ter um 2020 que encheu o público de boas novidades, como as séries Boca a Boca, Hard e Unidade Básica, a animação Senninha na Pista Maluca, e Milton e o Clube da Esquina. Sem contar a chegada nos cinemas do aguardado filme de Bárbara Paz, Babenco – Alguém Tem que Ouvir o Coração e Dizer: Parou (Imovision), nosso escolhido para representar o Brasil no Oscar.

E é assim que pretendem sustentar 2021: com organização, cuidado e agilidade. Já que contam com boas opções para entregar ao público, seja nos cinemas, seja na televisão, seja no streaming. E melhor de tudo, é conteúdo nacional de qualidade alcançando as audiências no momento em que mais precisam.

“Acredito que a produção de conteúdo segue sendo nossa solução, segue sendo nossa receita para enfrentar a pandemia. E percebemos, cada vez mais, que o público brasileiro e internacional se interessa pelo conteúdo brasileiro de qualidade, que emociona e que diverte. A pandemia passará e as nossas histórias continuarão fazendo sucesso no Brasil e no mundo”, comentou Fabiano Gullane, sócio da produtora.

Para Gullane, o público, quando tudo isso tiver passado, sentirá vontade de ver histórias felizes, histórias alegres e de superação. Além disso, o cinema, como tradicionalmente é, será ainda mais um espaço de reconhecimento, tanto de nós mesmos, quanto de nossa história.

“Eu tenho certeza que o futuro do cinema é ainda mais brilhante. O cinema nos conecta com nosso melhor, ele nos faz sonhar, nos faz conhecer nossa própria história, nos faz acreditar nos próprios sonhos, nos faz crescer e nos aprofundar em nossa própria identidade”, ressaltou.

Para o futuro, no entanto, o executivo enfatiza a urgência de que as autoridades políticas brasileiras deem maior importância à indústria audiovisual brasileira, tão essencial para nossa economia e cultura, responsável por 2,5% do PIB do país.

“A gente exige que parte do que o brasileiro consome seja feita pelo seu povo. A gente exige que parte da riqueza fique na mão dos brasileiros. Isso é a política pública, que é tão importante para o desenvolvimento da indústria audiovisual brasileira. Não é uma questão de política, de direita ou esquerda, é uma questão econômica. É sobre isso que precisamos falar mais”, finalizou.

A entrevista faz parte do especial lançado pelo Portal Exibidor, desde o início do ano, trazendo os principais nomes do mercado para falar sobre suas Perspectivas para 2021.

Confira a conversa na íntegra:

Quais são as expectativas para o mercado de cinema em 2021?

Para a Gullane, que é uma produtora muito focada em conteúdo nacional para o público brasileiro, muito focada também em conteúdo nacional para exportação, a continuidade da pandemia é motivo de muita preocupação. Achamos que as restrições, ou pelo menos parte das restrições em nosso mercado, especialmente em salas de cinema, fossem ficar em 2020, mas também teremos que enfrentar os cuidados com a pandemia em 2021.

Provavelmente o mercado de cinema deve aquecer mais solidamente no segundo semestre. No primeiro semestre devemos perceber uma repetição do que vimos ano passado, com o mercado de cinema muito abaixo da sua capacidade, em um cenário muito ruim em termos de presença do público. E isso é uma pena. A gente precisa achar um mecanismo para apoiar os nossos exibidores, para apoiar a volta do público brasileiro às salas de cinema. Certamente as salas de cinema devem ser um dos lugares mais seguros para se estar neste momento de pandemia, com todos os protocolos, cuidados e responsabilidades sendo atendidos. Dentro da sala de cinema não se come, não se conversa, não se movimenta, é um local muito adequado para se estar. Por isso, eu espero que em 2021, mesmo com todas as restrições e protocolos, o cinema possa ser um lugar que o público volte a frequentar.

2020 foi um ano que pegou todo o mercado de surpresa, como vocês se prepararam e estão se preparando para este ano?

A chegada da pandemia foi muito inesperada e continua sendo em 2021. Acho que as produtoras têm conseguido se manter funcionando muito em função do seu estoque de projetos. Nós temos muitos projetos em diversas fases. Quando não estamos conseguindo filmar por restrições da pandemia, nós estamos em desenvolvimento ou em preparação, em pré-produção, em pós-produção, ou em lançamento dos projetos. E como a Gullane é uma produtora de grande porte que tem capacidade de gerenciar 10, 12 projetos simultaneamente, conseguimos passar 2020 dessa forma, e estamos nos preparando para este ano também, exatamente com essa receita - acelerando a pós-produção, a finalização de projetos que já estavam filmados, acelerando o ritmo de desenvolvimento e de financiamento de projetos que já estavam desenvolvidos. Temos dois grandes projetos de animação que estamos conseguindo produzir mesmo neste período de pandemia.

As estreias, os lançamentos, especialmente em televisão e em plataformas de streaming, que foram muito valorizadas em 2020, provavelmente seguirão assim neste ano. Ano passado lançamos muitos projetos como as séries Boca a Boca, Hard, a segunda temporada de Unidade Básica, a animação Senninha na Pista Maluca, Milton e o Clube da Esquina, além do lançamento nos cinemas do documentário Babenco – Alguém Tem Que Ouvir o Coração e Dizer: Parou, em coprodução com a HB Filmes, e planejamos o mesmo para 2021.

Acredito que a produção de conteúdo segue sendo nossa solução, segue sendo nossa receita para enfrentar a pandemia. E percebemos, cada vez mais, que o público brasileiro e internacional se interessa pelo conteúdo brasileiro de qualidade, que emociona e que diverte. A pandemia passará e as nossas histórias continuarão fazendo sucesso no Brasil e no mundo.

 

Quais tipos de histórias você acha que as pessoas terão mais vontade de assistir depois da pandemia?

A gente vem percebendo que o público tem gostado muito de histórias mais abertas, que repetem um pouco os elementos da vida cotidiana, como histórias de amor, de superação, histórias que mostram um pouco as aventuras, as dificuldades e as conquistas que a gente vivencia. Acredito que depois da pandemia, esse tipo de história vai ser ainda mais valorizada. Neste momento, deveríamos trazer histórias felizes, de sucesso, de superação, histórias que nos tragam esperança, e uma visão de mundo melhor. O mundo real já trouxe muita preocupação, insatisfação, frustração e muita tristeza em diversas áreas - do ponto de vista econômico, político, social, na saúde especialmente, com tantas perdas, com tantas mortes. Eu acho que com o cinema, com a televisão e com as plataformas, a gente tem tudo para ajudar a alegrar um pouco o nosso público, a trazer uma reflexão de como podemos ajudar a melhorar o mundo. E eu acho que não só as histórias que são contadas no cinema, TV e plataformas podem ajudar a causar essa diferença, mas as histórias que cada um está contando na própria vida. De assumirmos um pouco esse protagonismo ao narrar a nossa trajetória de um jeito melhor, e transformar aquelas pessoas que estão ao nosso lado, para que isso reflita em nossa comunidade, mirando um mundo diferente. E eu acho que o cinema, a dramaturgia no geral, vai ter um pouco esse compromisso nos próximos anos.

Como tem sido a experiência de retomar as filmagens em meio a todos os protocolos de segurança?

As filmagens com os protocolos despertam muita responsabilidade. Não tem nada mais importante do que a saúde das pessoas. A gente demorou para decidir voltar a filmar, para combinar entre todos os players e entidades do setor, da forma mais completa possível, como seriam esses protocolos. Então é importante deixar isso bem expresso aqui, que nenhuma produtora voltou sozinha ou teve uma atitude isolada. Todas as produtoras, através dos seus sindicatos estaduais, de suas associações, todas discutiram coletivamente. Depois discutimos com os sindicatos e associações dos técnicos e artistas, e, posteriormente, com o poder público. E isso gerou um protocolo bastante completo e com um olhar de todos os envolvidos da produção audiovisual. Então é com muita tranquilidade e orgulho que posso afirmar que o Brasil tem um dos protocolos mais regulares e mais completos do mundo em termos de filmagem. A gente já ouviu de muitos players internacionais, de plataformas e TV, que comparam os protocolos usados aqui e elogiam de forma bastante sólida o que estamos utilizando no Brasil. É claro que esses protocolos custam mais dinheiro, por isso exigem mais investimento nos projetos, geram mais necessidade de tempo de produção, de filmagem, expõe todos que estão ali a algum risco, isso não tem dúvida, pois estamos em pandemia e temos que filmar. Mesmo assim, nos dá a sensação de que estamos trabalhando em um lugar seguro, que estamos conseguindo executar nossa profissão de uma forma responsável, planejada, técnica e científica. Isso tem trazido muita segurança para nós produtores, para os contratantes, para as plataformas, para os artistas, para os técnicos e para todos os que estão conosco.

Nas relações comerciais privadas entre produtoras, plataformas e televisões, essa composição já está muito madura. Fica aqui um apelo para que a ANCINE trabalhe bastante esse tema em cima das produções independentes. Os produtores independentes, incluindo a Gullane, estão muito tensos ainda sobre como serão encarados pela ANCINE os gastos extras que estamos tendo ou teremos, com protocolos, com testes, com gastos médicos, com extras de alimentação, filmagens, cuidados sanitários. Como serão tratados esses gastos extras dentro do orçamento, dentro da prestação de contas. Esse é um assunto que ainda não foi tratado de frente pela ANCINE. Fica aqui até uma sugestão de que a ANCINE faça um possível redimensionamento de 20% de uma forma geral para todos os projetos, para que os produtores possam usar esse valor para despesas de protocolo Covid-19, e que seja aceito depois na prestação de contas, de acordo com o TCU e com todas as normas vigentes. Para que a gente possa ter segurança em estabelecer esse protocolo, pagar por ele e depois não ser questionado no futuro, como a gente vê acontecer em projetos do passado ao terem suas prestações de contas analisadas.

O streaming está cada vez mais consolidado, como isso impacta o trabalho dos produtores?

O streaming realmente chegou para revolucionar o mercado. Uma pena que ele tenha chegado com toda força nesse contexto de pandemia, porque de alguma maneira ele acabou assumindo o lugar da sala de cinema neste período. A gente vê que o faturamento das salas de cinema caiu vertiginosamente enquanto teve um aumento no número de assinantes de streaming, de compras de TVOD e de assinaturas de TV a cabo. O Home Entertainment, onde o streaming se encontra, que você consome em casa, subiu muito, obviamente em função da pandemia.

E aqui na Gullane acreditamos que o streaming potente, desenvolvido, vai conviver muito bem com a janela da sala de cinema. Vamos ter cada vez mais lançamentos bonitos em cinema, onde o filme terá seu destaque, sua grande vitrine, sua grande campanha de marketing, sua deliciosa experiência social na tela grande, para depois complementar assistindo mais uma vez, em casa, nas plataformas, com materiais extras, como o making of. Então essa composição entre o grande lançamento, a grande primeira janela na sala de cinema e depois ter tudo disponível em casa pelo streaming, para nós produtores de conteúdo, é um sonho. É ter nosso produto consumido em sua grande potencialidade.

Ficamos muito felizes com o streaming atingindo patamares cada vez mais altos, levando obras brasileiras para o mundo todo. Trazendo obras de outros países para o Brasil. É muito bacana ver como o streaming está fazendo do mundo um lugar pequeno, um lugar globalizado onde a gente, de uma forma muito simples e fácil, acessa conteúdo de qualquer parte do mundo, assim como somos acessados por qualquer parte do mundo. É incrível também a qualidade e a capacidade dos executivos das plataformas, como eles estão com a cabeça aberta, como eles estão conectados com seus pares em outros países, como isso traz oxigênio para conversas, para interlocução com nós produtores, diretores, roteiristas, como isso enriquece a conversa sobre o projeto, sobre a carreira comercial do projeto, lançamento, sobre a carreira no Brasil e internacional.

O trabalho com as televisões do Brasil, que já é muito bom, só vem crescendo com a chegada do streaming. Já é muito bom trabalhar com os grandes grupos de TV, tanto abertas como fechadas, que já operam de uma forma muito importante no país. Eu acho que essa operação só cresce com a chegada dos streamings e só melhora. Estamos melhorando no conteúdo, nos processos, na entrega. Então está sendo uma relação de muito ganho. E o Brasil é um mercado consumidor enorme, sendo um dos protagonistas nessa implantação de novos mercados e tecnologias, é muito interessante fazer parte disso e acompanhar essa evolução e transformação do mercado.

Quais são seus palpites sobre como será o futuro do cinema?

Eu tenho certeza que o futuro do cinema é ainda mais brilhante. O cinema nos conecta com nosso melhor, ele nos faz sonhar, nos faz conhecer nossa própria história, nos faz acreditar nos próprios sonhos, nos faz crescer e nos aprofundar em nossa própria identidade. O cinema é conhecer sobre o nosso próprio conteúdo, sobre nossa origem e cultura. E cultura não no sentido de cultura artística, mas no sentido de quem somos, de onde viemos, o que carregamos do nosso DNA cultural. Cinema talvez seja a expressão artística mais completa, ela conjuga a literatura, a música, artes plásticas, a interpretação, a mímica, a comédia, o drama, todo tipo de arte está de alguma maneira representada também no cinema. Esse conteúdo que o cinema traz e transporta para as pessoas, que hoje também tem sido reconhecido como conteúdo audiovisual, é o futuro do planeta. Hoje tudo é audiovisual, hoje você é atendido em seu banco por um ícone do audiovisual. Você fala com uma voz em áudio, você assiste algo no YouTube, vê uma série, tudo é audiovisual.

O conteúdo audiovisual tem essa importância histórica, ele vai ser o que os livros de história foram nos séculos passados. A nossa história no futuro vai ser contada através dos livros, claro, mas ela também vai ser contada através de todas essas mídias. As novas gerações vão conhecer nosso presente muito mais pelo audiovisual do que através de outros registros do nosso tempo. Eu vejo o futuro do cinema cada vez mais tecnológico, cada vez mais nos dando uma experiência em grandes telas. Acredito que já temos experiências incríveis como o 3D, cadeiras sensoriais, o som incrível com diversas variações, as telas cada vez maiores, a experiência dos cinemas drive-in que voltaram e que são uma delícia.

Para finalizar, gostaria de deixar um recado para os leitores do Exibidor e para as pessoas do nosso país, de que o entretenimento, a indústria do audiovisual, são indústrias muito poderosas, são indústrias do futuro, são indústrias que interessam ao jovem de hoje em dia. São carreiras que despertam muita vontade no jovem. Então gostaria de fazer aqui, em nome de todo o setor, em nome de todos que dedicaram uma vida por essa profissão, pedir ao nosso governo, ao Estado Brasileiro, que olhe com atenção, com respeito para esse setor.

O audiovisual é uma indústria enorme, que emprega 300 mil pessoas, que mexe com quase 2,5% do PIB brasileiro. O Brasil é uma potência mundial no consumo de audiovisual. Somos um dos maiores mercados do mundo para consumir obras audiovisuais, especialmente faladas em inglês, mas do mundo inteiro. E isso quase nos obriga, como país, a que um pedaço dessa parcela milionária seja investida nos nossos jovens, na nossa indústria, para que o Brasil não seja somente um curral, uma fazenda de faturamento. Já que ele gera tanta riqueza para as multinacionais que faturam bilhões - e a gente adora fazer parte dessa cadeia, porque amamos bons filmes e séries - mas a gente exige que um pedaço desse faturamento seja investido no próprio país. A gente exige que parte do que o brasileiro consome, seja feita pelo seu povo. A gente exige que parte da riqueza fique na mão dos brasileiros. Isso é a política pública, que é tão importante para o desenvolvimento da indústria audiovisual brasileira. Não é uma questão de política, de direita ou esquerda, é uma questão econômica. É sobre isso que precisamos falar mais.

Compartilhe:

  • 1 medalha