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09 Outubro 2024 | Gabryella Garcia

Conteúdo infantil nacional nos cinemas é necessário para educar e também contar nossas próprias histórias

Painel da Expocine discutiu a importância de colocar produções infanto-juvenis brasileiras nas escolas, mas também pontuou as dificuldades para o setor

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(Foto: Fabiano Battaglin)

O painel Formação de Público Desde a Infância, realizado na Expocine 2024, debateu a necessidade da formação do público infantil nos cinemas sob o ponto de vista educativo, além da importância de contar histórias brasileiras para criação de uma identificação e conhecimento da própria cultura. O principal entrave apontado para essas produções - apontado no painel que contou com a participação do produtor executivo e fundador da produtora infantil Flamma, Reynaldo Marchesini; da diretora-geral do Festival Comkids, Beth Carmona; e da presidente da ABCA (Associação Brasileira de Cinema e Animação), Adriana Pinto - foi a falta de fomento e incentivos para produções infanto-juvenis. A mediação do painel foi feita por Alessandra Meleiro, presidente do Instituto Iniciativa Cultural.

A Lei Nº 13.006, de 26 de junho de 2014, estabelece que a exibição de filmes de produção nacional deverá constituir a grade curricular complementar integrada às propostas pedagógicas das escolas, com exibição obrigatória por, no mínimo, duas horas mensais. Entretanto, Beth Carmona apontou dificuldades para o cumprimento da lei. "Falta ser regulamentada de forma efetiva e existe um grupo no MEC, no MinC e na Secom para conseguir regulamentar essa lei", disse. "É preciso uma formação de público sob o ponto de vista educativo para inserir essa temática nas escolas, mas faltam iniciativas de regulamentação para de fato esse conteúdo estar presente nas escolas", completou Marchesini.

O fundador da Flamma, que trabalha há 27 anos com animações infantis, resolveu fundar a produtora após se tornar pai e por sentir uma responsabilidade em fazer conteúdo infantil na área criativa com um olhar mais educacional. "Fazer produção infantil tem a ver com a conexão com cinema, porque o contato com o audiovisual começa na infância. Alguma conexão com alguma história infantil. Do meu ponto de vista, como produtor brasileiro, acho fundamental ter espaço para contar histórias brasileiras para crianças brasileiras. Não acho que seja uma polaridade poder ver conteúdos estrangeiros também, mas temos que contar nossas histórias para inspirar as crianças, e sempre com qualidade e responsabilidade", disse.

Na avaliação de Adriana, e de seus outros colegas, o principal entrave para que essas histórias possam ser contadas é a falta de fomento. A presidente da ABCA afirmou que grande parte da produção para crianças gira em torno de animações e "a animação é o primo pobre do audiovisual na questão do fomento". Ela destacou que por ser um tipo de produção que leva mais tempo, consequentemente se torna mais caro e, por isso, "é complicado competir na mesma linha de outros gêneros".

"Precisamos nos preocupar com a distribuição e a difusão porque essas produções existem e às vezes não tem como distribuir. Às vezes é mais fácil vir com um conteúdo estrangeiro pronto até do ponto de vista econômico. Não temos uma linha de fomento especial para a produção infantil. Existem muitas iniciativas muito mais no âmbito educativo do que comercial e acho extremamente importante que possamos produzir conteúdos brasileiros. No Brasil, somos extremamente colonizados e na infância isso é ainda mais cruel. Meu sonho é que tivéssemos pelo menos uma cota para produções infantis", disse.

Beth Carmona também trouxe para o debate alguns números que ilustram que hoje as crianças são "mais livres" e é mais fácil se comunicar diretamente com elas, sem intermédio dos pais, por exemplo. Em outros tempos, as crianças não tinha muita liberdade de escolha no conteúdo e eram submetidas aquilo que passava na TV, mas algumas pesquisas recentes mostram que praticamente 90% das crianças e adolescentes brasileiras são usuárias da internet e que 95% dessas crianças acessam via celular e, dentro dessa faixa, 73% vêm de lares menos favorecidos. Outro dado trazido e que ilustra a "liberdade de escolha das crianças" é o fato de 50% ou mais delas acessarem diretamente o YouTube para consumirem algum conteúdo.

"A infância contemporânea está em constante mutação, assim como a sociedade contemporânea está. Isso está acontecendo em uma velocidade absurda e nós, que produzimos conteúdos brasileiros para crianças, temos que acompanhar esse processo. A criança do século XXI está exposta a múltiplas telas e os conteúdos acontecem nessas telas em uma velocidade muito grande. Esses números mostram que essas histórias, que algumas vezes são brasileiras, geram impacto e abrem diálogo com as crianças e a cada contato alguma coisa fica naquela criança e gera algum impacto. Essas histórias propiciam uma vivência muito particular", destacou. "Quando falamos de formação, nós estamos falando de formação do olhar, formação da identidade e de educação de uma maneira geral. Não tem como fazer história para crianças sem alguma preocupação educacional ou de responsabilidade sobre aquela história. Então educar para o mundo das imagens é poder oferecer recursos para que essas crianças tenham seu olhar estimulado e aprendam do ponto de vista da estética visual. Essa formação perpassa pela mensagem da história, passa também pela formação estética", completou.

No final da apresentação, a diretora do Festival Comkids ainda destacou que a situação da produção infantil e animações brasileiras melhorou desde que uma lei obrigou que canais de TV por assinatura fossem obrigados a exibir conteúdos nacionais, mas também ponderou que é necessário muito cuidado na hora de produzir para o público jovem.

"As produtoras se desenvolveram e fizeram uma boa alavanca para mostrar a força, a cor e a criatividade da cultura brasileira que foi para fora. Mas a questão da faixa etária é complicada e precisamos tomar cuidado. As equipes precisam de muito estudo e flexibilidade, e estarem próximas do público. Precisam ser grandes observadoras da vida infantil, observar as crianças e saber por onde ela caminha. É necessário que o produtor e o criador estudem o desenvolvimento infantil", finalizou.

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