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Artigo / Cinema

09 Junho 2020

O passado bate à nossa porta

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O Governo Americano pretende alterar as antigas regras antitruste que mantêm sob controle os principais estúdios de cinema. Isso poderia ser um problema para algumas redes de cinemas e seus cinéfilos.

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Com as mudanças que o Departamento de Justiça do Governo Trump está propondo, qual será o futuro das salas de cinema nos EUA? E, se isso se concretizar, como isso impactará toda a indústria de Exibição ao redor do mundo?

Vamos voltar para um dos momentos mais cruciais da história de Hollywood, em 1948, na Suprema Corte, através de um caso conhecido como Estados Unidos versus Paramount Pictures. Em uma decisão quase unânime (7 a 1), o tribunal decidiu que os estúdios de cinema não podiam possuir seus próprios cinemas, interrompendo um sistema pelo qual os principais distribuidores controlavam de forma absoluta, a experiência do cinema. Essa prática significava que muitos cinemas tinham permissão para exibir apenas os filmes de um único estúdio e, foi proibida em nome das leis antitruste. Um sistema de décadas foi quebrado, criando mais concorrência. Agora, mais de 70 anos depois, o governo Donald Trump está anunciando que deseja que essas regras sejam desfeitas.

O Departamento de Justiça acredita que a abolição das restrições do “Caso Paramount” é uma medida há muito esperada, diante da nova realidade ​​do setor. "À medida que a indústria cinematográfica passa por mais mudanças com inovação tecnológica, com novos negócios de streaming e novos modelos de negócios, é nossa esperança que o término dos decretos do “Caso Paramount” abra caminho para inovações favoráveis ​​ao consumidor", afirmou o procurador-geral assistente Makan Delrahim.

Sem nenhuma dúvida isso incentivará mudanças, ainda mais com gigantes como Apple, Netflix, Amazon e os grandes estúdios com o poder de concentrar as produções, em todas as plataformas disponíveis.

Antes do “Caso Paramount”, os grandes estúdios mantinham relacionamentos com as salas de cinema ou eram proprietários delas. Isso fazia parte do processo de criação de filmes, onde todo o universo criativo estava vinculado - atores, roteiristas, diretores, pós-produção e distribuição - em contratos usualmente leoninos, assegurando o total controle sob o mesmo guarda-chuva. Em 1938, o governo dos EUA processou todos os principais estúdios por violar as leis antitruste, nomeando o maior (Paramount) como o principal réu, mas também acionando MGM, Warner Bros (Loew's Incorporated), 20th Century Fox, Universal, Columbia, Radio-Keith-Orpheum - dissolvido em 1959 e United Artists.

Walt Disney Studios não funcionava na época como distribuidora (usava principalmente a RKO Pictures para lançar seus filmes de animação). Mas até a Disney cumpriu as regras estabelecidas na decisão do “Caso Paramount”.

O “Caso Paramount” e os decretos resultantes alteraram significativamente a estrutura da indústria cinematográfica, com uma separação entre distribuição e exibição de filmes, exigindo que os cinco réus que então possuíam cinemas desistissem de suas operações de distribuição ou dos seus cinemas. Outras práticas desfavoráveis aos Exibidores, também foram proíbidas, fortalecendo a concorrência e ao florescimento de redes independentes, cinema de arte e filmes estrangeiros.

Parece improvável que o Departamento de Justiça derrube as restrições do “Caso Paramount” abruptamente, mas, várias análises advertem que o negócio de salas de cinema passa por algumas transformações desfavoráveis, mais do que o habitual. Há algum tempo a venda de ingressos é irregular, e empresas como a AMC enfrentam dificuldades, Aliado a isso empresas como a Netflix declararam guerra com as grandes redes por conta das janelas de exibição, que possuem uma espera de três meses entre o lançamento no cinema e a disponibilidade on-line, um impasse que não mostra sinais de resolução.

Com a iminente mudança proposto pelo Departamento de Justiça dos EUA, como seria o cenário onde uma empresa como a Disney adquirisse uma grande rede de cinemas? Podemos imaginar um espaço multidisciplinar, incluindo cinema, retail, streaming, viagens e parques – isso é bom para alguns e catastrófico para outros.

E no caso da Amazon, que poderia aplicar seu modelo Whole Foods numa cadeia de cinemas, transformando os espaços dos complexos de cinemas em extensões de seus negócios on-line. Podendo ir além, com a assinatura Amazon Prime que inclua cinemas, produtos e serviços, complementando seu streaming.

As potenciais aquisições, talvez representem agregação de valor e prestígio para empresas de tecnologia que, apesar de todo o seu dinheiro e poder, ainda estão trabalhando para ganhar representatividade e reconhecimento ao lado dos gigantes de Hollywood.

Os dois lados – tecnologia e conteúdo - buscam os ativos mais valiosos um do outro: a Disney possui filmes de grande sucesso nos cinemas, e agora pretende atingir os assinantes de streaming da Netflix com o Disney +. Enquanto isso, a Netflix domina o streaming, mas a empresa - ao lado da Amazon e até da Apple - está investindo para ganhar legitimidade nos cinemas.

O posicionamento do Departamento de Justiça é que se os consumidores acabarem sendo prejudicados pelas novas mudanças, "os agentes antitruste continuam prontos para agir", disse ele, segundo o The Wall Street Journal. A ascensão de empresas de tecnologia, que obtém lucros totalmente online, sugere que as restrições impostas pelo “Caso Paramount” pertencem ao passado. Sem considerar que a Netflix já arrendou a Paris Theatre de Manhattan, no final de 2019, onde pode exibir seus próprios filmes.

A NATO – National Association of Theaters Owners, expressou sua preocupação com o futuro preocupante que a decisão do Departamento de Justiça poderia criar. "Se os exibidores fossem obrigados a reservar a grande maioria de suas telas nos principais filmes de estúdio durante a maior parte do ano, isso deixaria pouco ou nenhum espaço para filmes importantes de estúdios menores", em seu comunicado. O Departamento de Justiça fez seus próprios comentários, dizendo que a evolução dos negócios ao longo das décadas deixou o “Caso Paramount” sem sentido - "A nova tecnologia criou muitas plataformas diferentes de distribuição e visualização que não existiam quando os decretos foram firmados".

Ainda não está claro em quanto tempo a medida seria implementada, mas o Departamento de Justiça disse que planeja eliminar gradualmente as regras ao longo de um período de dois anos.

Somado à isso temos uma pandemia, que até pode orientar os estúdios no caminho da consolidação de seus próprios serviços de streaming, do que em entrar no negócio de exibição, mas uma série de outros Players poderão dar uma nova cara à este negócio, visto que os grandes estúdios parecem começar a se afastar de projetos com riscos financeiros elevados.

Por enquanto esse imbróglio está na Terra do Tio Sam, mas com a pandemia acelerando as mudanças, fica a dúvida se e quando haverá um caminho não conhecido para a exibição nos EUA e como isso afetará a América Latina e restante do mundo. Sem dizer dos artistas, fornecedores e cinéfilos etc...etc...

Luiz Fernando Morau
Luiz Fernando Morau | morau@integradora.digital

Profissional sênior em infraestrutura, desenvolvimento e integração de soluções no audiovisual, digital cinema, broadcast, games, VR, AR e digital signage. Sócio e CEO da INTEGRADORA DIGITAL

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