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Artigo / Comportamento

08 Junho 2020

Por que o mundo está assistindo séries israelenses?

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O que “Fauda” e “Shtisel” têm em comum, além do nome incompreensível para nós brasileiros?

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Fauda é uma palavra de origem árabe que significa "caos" e representa uma série de suspense político da YES – canal israelense. “Shtisel” é uma série dramática sobre uma família ortodoxa, que vive em Jerusalém. Criada e escrita por Ori Elon e Yehonatan Indursky, a série estreou em 2013 no canal YES e hoje, ambas são distribuídas em todo o mundo pela NETFLIX.

No Brasil, temos uma tradição forte de assistir a conteúdos americanos, mas o recente (ou não tão recente) sucesso do conteúdo em hebraico tem sido uma novidade. São realidades bastante distintas da nossa e uma língua totalmente inusitada para nós.

Como explicar o sucesso das séries israelenses?

Israel é um país jovem (1948) e menor do que São Paulo, com menos de 10 milhões de habitantes. São cinco grandes broadcasters sendo um canal publico. Por outro lado, o mercado independente fervilha com 120 produtoras responsáveis por aproximadamente 20 longas de ficção, 200 horas de conteúdo ficcional televisivo e 90 horas de documentários por ano. Em comparação com o Brasil, lançamos em cinema aproximadamente 100 títulos de longa metragem ficcional por ano (cinco vezes superior) com uma população 20 vezes maior que Israel, ou seja, proporcionalnte Israel produz mais que o Brasil.

Impossível falar do sucesso das séries israelenses sem mencionar “Prisoners of War” ou “Hatufim/Khatufim”, série de drama produzida pela Keshet e exibida no canal 2 em 2010. Criada por Gideon Raffi e vencedora do maior prêmio israelense para TV, a série foi adquirida pela FOX e adaptada para o mercado americano com oito temporadas e 96 episódios como “Homeland”, exibida no canal Showtime nos Estados Unidos e distribuída no mundo todo. A série foi também adaptada em outros países como Índia e Rússia e recebeu o Globo de Ouro em 2012 e 2013.

Outro exemplo de sucesso foi a série “Betipul”, criada em 2005 pelo psicanalista Hagai Levi, que gerou a versão estadunidense intitulada “In Treatment”. Parte do sucesso na sua adaptação se deve ao formato baseado num roteiro forte, porém simples, com basicamente um cenário e um número limitado de atores.

Sua versão nacional, “Sessão de Terapia”, produzida e exibida originalmente pelo GNT entre 2012 e 2014, em 115 episódios divididos em três temporadas, retornou pelo Globoplay ano passado.

A simplicidade e a universalidade dos temas, são fatores chave para o sucesso das adaptações.

O aprendizado da Coprodução internacional – conteúdo para exportação

Com um cinema jovem, Israel está presente em grandes festivais internacionais e tem obtido enorme reconhecimento como:

- “Synonyms” vencedor do festival de Berlim em 2019, uma coprodução com França e Alemanha;

- “The Cakemaker” (O Confeiteiro) de 2017, uma coprodução com a Alemanha e vencedor em Karlovy Vary;

- “Waltz with Bashir” (2008), uma coprodução com Alemanha e França nomeado para a categoria de melhor filme estrangeiro da Academia e vencedor de prêmios internacionais.

Parte da receita de sucesso está na força das coproduções internacionais. Responsabilidade do incansável Katriel Schory (head do Israeli Film Fund), Israel conta com diversos acordos de coprodução (inclusive com o Brasil) que resultam em aproximadamente quatro filmes de ficção por ano (ou 25% do total produzido) e cinco a dez documentários por ano.

Por ser um país com recursos limitados para o cinema (US$ 22 milhões/ano), os produtores buscam na coprodução internacional não só uma colaboração artística, mas financeira. O resultado é extremamente positivo! Mais de 25% da produção de cinema do país (mesmo % das coproduções) têm sucesso nas exportações, tendo como principais mercados a Europa e a América do Norte. Entre 2016 e 2017, aproximadamente seis filmes israelenses foram lançados no circuito de cinema da Europa, Estados Unidos, Canadá e países da América do Sul.

Incentivo a produção independente - Regulamentação

Em Israel, 33% da produção televisiva deve ser de conteúdo local (exceto notícias, esportes). Desse total, 60% deve ser comissionado a produtores independentes.

No Brasil a lei 12.485 de 2012 determinou “A obrigação de veiculação de conteúdo nacional começa com 1h10 por semana em cada canal que exiba predominantemente filmes, séries, documentários, animação e aumenta até chegar ao máximo de 3h30 por semana em setembro de 2013 (o que corresponde a 2,08% das 168 horas de programação semanal de cada canal)”. (Ancine)

Nos Estados Unidos, uma política de proteção e incentivo à produção independente (realizada por empresas produtoras sem vínculos com os canais) praticada entre as décadas de 1970 e 1990 é apontada como fator determinante para o fortalecimento do mercado de séries e filmes norte-americanos, possibilitando inovação, diversidade de conteúdos e desenvolvimento. (Ancine)

Fatores chave de sucesso

  • Super local

De acordo com Danna Stern, da YES Studio, o foco é em estórias e produções super locais: "Fazemos menos programas de policiais e nenhum de hospital", afirma. "Os americanos podem fazer isso melhor do que nós. Mas podemos realmente fazer programas que ressoam daqui. O que funciona para nós é quando um programa é hyperlocal."

 Exemplos claros do hyperlocal:

- “Srugim”: série israelense que foi ao ar originalmente na Yes TV entre 2008 e 2012. A série retrata a vida de cinco homens e mulheres religiosos e solteiros, na casa dos 30 anos, que residem em Jerusalém.

- Arab Labor: exibida no Channel 2 em Israel de 2007 a 2012, a série foca nas questões familiares e de trabalho de Amjad, um jornalista árabe-israelense. Seu dilema está na relação de amor e ódio com sua identidade árabe e vontade de integração a sociedade israelense. 

  • “O povo do livro”

Há muito se discute a relação entre a literatura e o cinema ou a TV. Rodrigo Teixeira, produtor brasileiro, reconhecido por suas adaptações de sucesso.

 A cultura judaica da leitura e do debate premeia fortemente a sua produção cultural e modelou a indústria editorial do país. Com menos de 10 milhões de habitantes, o país conta com mais de 4 mil novos livros publicados por ano e 35 milhões de livros vendidos anualmente.

“Não temos barreiras linguísticas. A qualquer momento, aproximadamente metade dos livros das listas de best-sellers locais serão traduções”, explica Lewis. "A porcentagem aumenta para livros para crianças e jovens adultos. Israel é um caldeirão cultural e não há problemas em traduzir, publicar e comercializar trabalhos traduzidos. Há dez anos, a ficção indiana era particularmente popular aqui, seguida pela espanhola. Agora, a tendência é a Escandinávia, é claro, e estamos constantemente tentando avaliar onde será a próxima área comercial frutífera literária: China? Brasil?" (https://publishingperspectives.com/2012/10/publishing-in-israel-a-snapshot-overview/)

“Shtisel”, a série, e baseada no livro de Ori Elon – autor de diversos livros, por exemplo.

  • Diversidade

De acordo com a Consultoria Mckinsey & Company em suas pesquisas mais recentes, há um grande vínculo entre diversidade e a performance financeira das empresas. No audiovisual não poderia ser diferente.

Com uma população de diferentes religiões, backgrounds e aproximadamente 30% da população formada por jovens imigrantes, Israel é um dos países mais diversos do mundo.

Israel e também uma sociedade extremamente igualitária quando comparada ao Brasil e considerado o oitavo país mais seguro do mundo para mulheres pelo The New World Wealth research group.

Tendo na sua formação uma mulher a frente do Estado, Golda Meir, Israel se destaca como um dos 15 países de maior participação da mulher no trabalho (IMD) e com significativa participação em posições de liderança.

Essa diversidade é totalmente presente no audiovisual com duas mulheres produtores na série “Fauda” e uma equipe de grande diversidade de backgrounds.

Além do sucesso das ficções israelenses, o mercado de não ficção também e muito forte e o país e grande exportador de formatos como “Rising Stars”, mas os detalhes ficam para um próximo artigo

Sabrina Nudeliman
Sabrina Nudeliman

CEO da Elo Company. Formada em administração de empresas na FEA-USP e Florida International University (International Business), possui cinco anos de experiência na Consultoria McKinsey & Company e dois anos como líder de comunicação e marketing - Ink Group e Edelman Group. A executiva foi homenageada no Rio Content Market 2016 e já ministrou diversas palestras e aulas no Brasil e no exterior, entre elas, no Festival de Cinema de Cannes.

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