29 Janeiro 2025
A importância da trilha sonora nos filmes
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Muitas vezes quando falamos de uma obra audiovisual, como um filme ou uma série, nos atentamos muito mais a elementos como o roteiro, imagem, elenco, fotografia e figurino, e não nos damos conta do que está acontecendo em paralelo, no universo sonoro.
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A trilha sonora está lá o tempo todo, às vezes mais imperceptível, às vezes em destaque, mas, proporcionalmente, fala-se muito pouco sobre ela. Até em momentos de “silêncio”, o som é importante e está lá. Porque a trilha sonora, na definição mais acadêmica, inclui toda a ambientação sonora, os efeitos especiais (SFX) e sonoplastia (foleys). Às vezes pensamos: “aqui só tem diálogo”, mas se nos atentarmos, tem o som do vento, um cachorro ao longe, notas musicais longas, graves, estabelecendo uma tensão na cena, mesmo não sendo, propriamente, “música”.
De fato, é um equívoco recorrente confundir-se e tratar como trilha sonora unicamente as canções - que frequentemente são utilizadas em sequências ou clipes musicais, além de créditos - e, infelizmente, quando isso ocorre, pode-se mencionar ou creditar os intérpretes ou compositores de canções como sendo autores ou responsáveis pela “trilha sonora”. É essencial que, na hora de divulgar sobre cada projeto, preste-se bastante atenção à equipe técnica de som e música completa, para que as pessoas que dedicam tanto tempo e energia a essa função possam ser devidamente reconhecidas.
Além da ambientação sonora e dos fonogramas licenciados, temos todo um trabalho de trilha sonora incidental (“music score”) - um longa metragem pode chegar a ter mais de 100 “cues” (faixas individuais). Às vezes, somente um “pad” (notas longas, de coral ou de cordas, ou sons eletrônicos, que são mais como texturas, sem melodias ou ritmos específicos) já transmite toda a emoção de uma cena, sem atrapalhar ou ocupar o espaço dos outros elementos, especialmente o diálogo. (Na trilha do recente filme “Top Gun 2”, Hans Zimmer brilhantemente transmitiu a sensação do tempo parar usando longuíssimas notas desse tipo).
A trilha sonora de um filme nos ajuda, entre outras coisas, a viajar para outros lugares, outros tempos. Em “O Menino e o Mundo”, a trilha que eu e meu parceiro Gustavo Kurlat criamos para esse filme totalmente sem diálogos ajudava contar toda a história e nos levava para um mundo que pode ser o nosso, mas ao mesmo tempo era mostrado como se fosse de outro planeta, com dois sois no céu em determinado momento. Então, misturamos elementos de World Music, de música étnica de diversas culturas, como ciganas e orientais à sonoridades, ritmos e instrumentos do nosso Brasil, para compor essa mistura, seguindo o que o filme visualmente também traçava.
Agora, estreia dia 30 nos cinemas a comédia romântica “Viva a Vida”, que compus a trilha em parceria com Felipe "Pipo” Grytz e Vitor Zafer. E, embora num contexto totalmente diferente, live-action, com (muitos) diálogos, novamente resolvi colocar um amálgama da música étnica e da brasileira, dessa vez para nos levar numa viagem sonora do Brasil à Israel, e temporal através de uma saga de três gerações. Temos a presença de instrumentos reais e virtuais de ambas as culturas, com excelentes músicos, além de participações especiais de vários artistas brasileiros que fazem essa mistura de sonoridades, como a cantora Fortuna, Michel Niremberg e Ale Travassos , entre outros. Um destaque é a banda Grand Bazaar, com suas incríveis músicas ciganas com “DNA” brasileiro, cujas faixas encaixaram-se perfeitamente com alguns dos melhores momentos do filme.
Além disso utilizamos fonogramas do ídolo pop israelense Noam Bettam, e de uma banda russa chamada Leningrad (utilizada na hilária cena da bebedeira do destilado típico do Oriente Médio, o Arak, onde a canção “Rock’n’roll Star”, cantada em Russo, soa como se estivessem cantando “Arak Enrola”).
E para a sequência de créditos finais, numa homenagem à diversidade cultural de Israel e ao clássico filme “Priscilla, a Rainha do Deserto”, produzimos uma versão inédita da canção “Antes de Tudo”, da cantora Liniker, interpretada pelo incrível ator Diego Martins.
Ainda precisamos de muito trabalho de divulgação e conscientização para que os produtores musicais sejam reconhecidos pela importância de seus projetos no mercado audiovisual como um todo, mas aos poucos as pessoas estão começando a se familiarizar com alguns nomes que "chegam ao topo". O Brasil hoje já tem a sua música como um dos mais reconhecidos "produtos” internacionalmente exportados, e essa marca pode e deve incluir o trabalho de som e música para o mercado audiovisual.

Ruben Feffer
Compositor, Tecladista, Arranjador, Produtor e Diretor Musical, é o fundador da Ultrassom Music Ideas. Compõe e produz trilhas para cinema no Brasil e no exterior, séries de TV e teatro, com trabalhos premiados e reconhecidos em diversos festivais nacionais e internacionais. Recentemente ganhou junto com Gustavo Kurlat o prêmio de Melhor Trilha Sonora, no Festival de Brasília com o Curta-metragem “Kabuki”, além de outros já conhecidos como “O Menino e o Mundo” (indicado ao Oscar e vencedor de Annecy), “Guida” (vencedor do Anima Mundi e Annecy), ambos também em parceria com Gustavo Kurlat, com quem assina ainda a trilha de “Tito e os Pássaros”(vencedor do Anima Mundi em 2018) e “Empirium”. Em janeiro de 2025 será lançada mais uma obra que leva sua assinatura na trilha sonora, o longa-metragem “Viva a Vida”.
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