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Artigo / Tendências & Mercado

22 Setembro 2023

A estranha forma de programar

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Qual a última vez que você foi ao cinema para assistir a um curta-metragem?  

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Exceto em festivais e mostras, curtas-metragens na programação regular das salas de cinema são raridade.  

Vistos como um desafio para programadores e exibidores, os curtas passam longe das cinesemanas. Estranha Forma de Vida (O2 Play/MUBI) foge à regra, disruptivo como seu diretor, Pedro Almodóvar.  

Na quinta-feira, 14/9, dia de estreia, estava com ingressos esgotados no CineSesc, principal cinema de arte da cidade. Na data em que assisti, domingo, 17/9, havia pouquíssimos lugares disponíveis.  

O filme é seguido por uma entrevista nada sucinta do diretor, esmiuçando seu processo criativo e de construção da obra em questão, mesclando, sinuosamente e em retrospectiva, filmes anteriores e suas memórias cinéfilas do gênero western, as quais não são curtas.  

A ousadia na distribuição e no modo de se chegar ao público é condizente à trajetória de Almodóvar - que é um imã para o público - e às experimentações da MUBI, streaming que fincou o pé nos lançamentos bem-sucedidos nas duas janelas, a sua por tradição e às das salas, em parceria com a O2Play, que se renovou perante o mercado e ao público, trazendo às telas filmes cativantes para uma audiência jovem: Aftersun (2022), Close (2022), Os Cinco Diabos (2022), Medusa Deluxe (2023) e, com Estranha Forma de Vida, agrada os fãs de longa data de Almodóvar e quem o descobre em filmes dos anos 2000, vide Mães Paralelas (2021), A Voz Humana (2021).  

 

Curta-metragem + conteúdo extra 

Em 2021, meu marco do retorno à sala de cinema pós pandemia foi com a exibição especial do documentário The Velvet Underground, (Apple TV), de Todd Haynes. Como extra da sessão no IMS, uma entrevista feita pela cineasta brasileira Petra Costa com o diretor. A entrevista esticou a experiência do filme, potencializada pela atratividade de assistir a um documentário musical de uma banda icônica na sala de cinema, mesmo num cenário no qual a insegurança com o vírus da Covid ainda ditava nosso convívio.  

Dois anos depois e num contexto bem diferente, com o mercado exibidor enfrentando o rescaldo animador do fenômeno Barbenheimer,  a estreia do curta-metragem de Almodóvar é experiência e um experimento: ânimo para os cinemas voltados para os filmes de arte e uma experimentação de qual será a resposta do público perante a experiência de assistir a um filme mais curto do que de costume, seguido de uma entrevista intimista com o cineasta autoral mais celebrado do contemporâneo.  

Um caminho a se desbravar, além da exibição de curtas, é do conteúdo extra, normalmente disponibilizado no streaming, já que na nossa conta temos o nosso tempo: pausamos, passamos ou ignoramos.  

O que é fácil para Almodóvar e para cineastas consagrados é atrair o público independente da proposta de programação. Já para o cinema nacional e independente, o caminho é explorar o desafio e fazer da dificuldade uma oportunidade de encontro entre a audiência e a sala de cinema.  

Márcia Scapaticio
Márcia Scapaticio

Jornalista e mestranda em Estudos Culturais pela USP, trabalha com cinema há 10 anos, atuando em crítica e curadoria, internacionalização do cinema brasileiro em mostras/festivais, editais, difusão audiovisual em streaming e programação.

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