13 Setembro 2023
Produções infantis brasileiras são boas para todo setor audiovisual
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Na infância, lembro de entrar nas extintas videolocadoras e ver as seções: ação, comédia, aventura e… filmes nacionais. Como se o cinema nacional fosse um gênero. Algo à parte. Algo até exótico. Algo para ser experimentado de vez em quando. E quando se experimentava, o tratamento era diferente das produções internacionais. Explico.
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Já reparou que quando, as pessoas em geral, não gostam de uma produção internacional concluem: “Tal filme é ruim”. Não falam: “O cinema americano é ruim!”. Mas o mesmo não costuma acontecer com a produção nacional. Se alguém assiste a um filme brasileiro, que não o agradou, já dispara “cinema nacional não presta”. Mas se assistem algo que o cativa costumam falar “me surpreendeu. É brasileiro, mas é bom. É porque o diretor arrasa, etc”. O mérito é individual, mas o fracasso é coletivo. Tirando a comédia, grande parte dos adultos não têm o hábito de assistir a produções nacionais. Assistem de vez em quando. Talvez uma das ações para mudar esse cenário resida na infância.
A infância “é uma fase em que o cérebro se desenvolve em velocidade frenética e tem um enorme poder de absorção, como uma esponja maleável. As primeiras impressões e experiências na vida preparam o terreno sobre o qual o conhecimento e as emoções vão se desenvolver mais tarde”. É o que sustenta o americano James Keckman, 78, Nobel de economia. Tá, e onde entra economia nisso? Aqui: “Cada dólar gasto com uma criança pequena trará um retorno anual de mais 14 centavos durante toda a sua vida. É um investimento melhor, mais eficiente e seguro do que apostar no mercado de ações americano”, completa o economista. Dentro desse escopo de aprendizagem, formação e entendimento de mundo, o audiovisual brasileiro precisa ter espaço. E tendo espaço se forma público. Dessa forma, uma geração cresce para fase adulta levando em seu imaginário, em sua memória afetiva, o audiovisual brasileiro. Abertos a consumir a produção nacional. Mais ainda: com hábito de consumir. Claro, poderá gostar mais de um do que de outro. Mas não incriminará toda uma área por causa de uma produção que não o cativou. Essa geração tem provas concretas da qualidade das produções brasileiras levando isso por toda vida.
É difícil mudar um adulto, mas uma criança em formação é mais simples e mais possível. Basta ter presença. Por isso James Keckman pontua que o investimento na infância é eficaz, por ser de baixo custo em relação ao grande retorno a longo prazo. Para nós, produtores nacionais, isso tem a ver com formação e consolidação de público, não só para produções infantis, mas para todo setor audiovisual nacional. Por isso, insistimos nas animações voltadas para as crianças. No dia 14 de setembro, por exemplo, estrearemos a animação “A Ilha dos Ilus”, que traz uma percepção muito sensorial e lúdica para o público infantil. Tivemos o prazer de fazer algumas exibições em festivais e vimos como as crianças tinham suas atenções voltadas para o filme, durante toda sua exibição. Ali, entendemos que ajudamos a plantar uma pequena semente do audiovisual brasileiro. É um trabalho de formiguinha, mas muitas pessoas produzindo de forma constante é o grande poder que temos a longo prazo.
Com animação, temos popularizado as produções brasileiras na TV. No cinema, no entanto, é outro desafio. Falta muita estrada. Principalmente quanto aos investimentos.
Porém, é necessário continuar. É uma luta por mais investimento, luta para produzir, luta para continuar produzindo, luta para não haver retrocessos. Luta. Chego a achar que essa é uma das missões da nossa geração. Abrir caminho para os talentos que já existem, mas também para os talentos que virão. E deixando, como parte do legado, um público aberto à produção nacional. Quando converso com amigos da área de animação nacional e falamos em voz alta como é nossa cadeia produtiva e as oportunidades de negócio, de repente, nos damos conta: “Somos meio loucos por fazer isso”. Mas, às vezes, o mundo precisa dos loucos.
Paulo G.C Miranda
Paulo GC Miranda é um dos sócios-diretores da Mandra Filmes. Criou, dirigiu a série de animação Muralzinho. Foi também criador da série Ada e Rói. Participou, como um dos criadores, da série Julio e Verne. Todas essas produções estão também na Prime Video, Vivoplay e Box TV. Criou e dirigiu a recém lançada série "O Parque de Adelin" em exibição na TV Cultura. Atualmente está dirigindo a série, também em animação, chamada "Gnaks!" prevista para estrear em 2025.
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