Exibidor

Publicidade

Artigo / Tendências & Mercado

08 Março 2023

Produção exige difusão

Compartilhe:

O Encontro Setorial do Audiovisual organizado pela Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Governo do Estado de São Paulo realizado no início de fevereiro mais uma vez aponta para um problema histórico do cinema brasileiro: a falta de apoio governamental para a distribuição de curtas e longas-metragens que no Brasil, na maioria das vezes, são realizados com recursos públicos.  

Publicidade fechar X

Reunindo entidades de classe e representantes de produtoras independentes do Estado de São Paulo, o evento serviu para aproximar a nova equipe da secretaria de cultura do Estado mais rico da federação dos representantes do mercado e também discutir as diretrizes que serão adotadas para os editais do ProAC (Programa de Ação Cultural) em 2023 destinados ao setor. Segundo informações da secretaria, a estimativa é que 15 milhões de reais sejam destinados aos editais que contemplam projetos audiovisuais, valor 4 milhões de reais menor do que em 2022 já que se espera que a Lei Paulo Gustavo também injete um grande montante extra no setor cultural dos estados brasileiros, incluindo São Paulo. 

Instituído como Lei Estadual em 2006, o ProACSP se transformou no principal mecanismo de fomento à cultura em São Paulo, operando em duas modalidades: editais e renúncia fiscal via ICMS. O dispositivo foi fundamental para o setor audiovisual e artístico em geral durante o período da pandemia e durante toda a gestão federal anterior que praticamente paralisou as atividades da Ancine entre 2019 e 2022.  

Dado a proximidade do atual governador Tarcísio de Freitas com o governo Bolsonaro –  em que participou como ministro e teve apadrinhamento político do ex-presidente da República – foi com alívio, portanto, que a classe cinematográfica recebeu a notícia de que o ProACSP ocorreria sem grandes alterações em 2023, mantendo a política pública de apoio à cultura praticada pelo governo psdebista nos últimos 16 anos.   

Novo ano, novo governo e também velhos problemas, no entanto. Ao convidar a classe cinematográfica para apresentar as diretrizes gerais dos editais do ProAC que serão destinados ao audiovisual este ano – cuja previsão de chamadas devem começar a ocorrer no segundo trimestre – uma área estratégica para o setor se mostrou ausente pelo segundo ano consecutivo para fomento: a distribuição de filmes, sejam eles de curtas ou longas-metragens. 

Ao apresentar os resultados dos editais do ProAC de 2022 para o setor, a equipe de nova secretária de Cultura e Economia Criativa, Marília Marton, destacou que foram inscritos no ano passado mais de 800 projetos somente em busca de recurso para a produção de curtas-metragens no Estado e quase de 380 projetos de longas, sendo que destes 22 foram contemplados com recursos do edital.  

Não adianta, contudo, o governo do Estado de São Paulo mais uma vez focar recursos na produção e finalização de curtas e, principalmente, longas-metragens nos editais do ProAC de 2023 se as estratégias adotadas pela secretaria não preverem também valores que contemplem editais de distribuição. A última vez em que editais do ProAC foram abertos para esse “pé” do setor cinematográfico foi em 2021.  

Uma decisão no mínimo contraditória quando se observa que, desde 2019, a secretaria de cultura paulista adicionou à sua nomenclatura a expressão “economia criativa”. Ou seja, na prática o governo constatou a importância estratégica que produções têm para o estado de São Paulo do ponto de vista artístico e também econômico e social, mas ainda parece não ter compreendido que para que a economia criativa exista de forma plena em qualquer lugar do mundo é preciso enfatizar também a circulação e consumo de bens culturais.  

Resgatando a velha lógica herdada da economia fordista, um filme só se torna cinema quando chega a seu público e abre possibilidades de monetização aos realizadores que vão além da produção da obra cinematográfica. Que o ProAC consiga contemplar a distribuição nos editais vindouros e a expressão “economia criativa” possa fazer cada vez mais sentido tanto para a Secretaria de Cultura quanto para todos os agentes e representantes artísticos do estado de São Paulo.   

 

Márcio Rodrigo
Márcio Rodrigo | marcio.ribeiro@espm.br

Professor do curso de Cinema e Audiovisual da ESPM-SP, doutor em Comunicação e Artes pela UNESP e jornalista.

Compartilhe: