20 Maio 2021
Diferenciação: ponto-chave para vencer no mundo sob demanda
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Há espaço para tanto streaming? Esta pergunta surge na cabeça de muitos, inclusive na minha (link 1), toda vez que uma nova plataforma é anunciada. É fato que o número de assinantes não para de crescer, bem como o volume de anúncios que sustenta o AVOD (sigla em inglês de vídeo sob demanda apoiado por publicidade). O bolo cresce, mas o conjunto de interessados em uma fatia também. No Brasil, o número de serviços aumentou 26% só em 2020, de acordo com dados da Comscore (link 2). Enquanto isso, aqueles que já estão no setor há mais tempo, como Amazon e Netflix, por exemplo, intensificam seus investimentos em comunicação e novos conteúdos.
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Algumas previsões feitas recentemente apontam que sim, ainda há espaço para novas plataformas de video on demand. Quando a Digital TV Research (link 3) divulgou suas estimativas para 2026, muitos veículos destacaram apenas a possível chegada da Disney+ à liderança do setor, com 294 milhões de assinantes contra 286 milhões da Netflix. Contudo, foi pouco comentada a marca expressiva que caberia aos players menores: 565 milhões. Este número seria, ainda conforme a previsão da Digital TV Research, maior que Netflix, Prime Video, HBO e Apple TV+ somados.
Já é possível observar um movimento mais intenso de experimentação no mercado de vídeo sob demanda. Recentemente, Miguel Smirnoff (link 4), da Prensario Internacional, fez uma provocação relacionada com essa tendência: "O modelo da Netflix seria estável a longo prazo? Usuários começam a queixar-se de que 'todas as séries são iguais' e a ver os outros serviços de streaming com maior atenção. As estreias SVOD premium simultaneamente com Hollywood podem ser uma ameaça ao algoritmo.".
Nesse contexto tão complexo, uma palavra ganha força: diferenciação. Sem ela, torna-se impossível sobreviver a uma disputa que a cada dia fica mais feroz. É perda de tempo querer ser o melhor em tudo quando muitos concorrentes, a começar pelos gigantescos, prometem o mesmo. E é importante frisar que essa diferenciação não deve ser buscada apenas pelas plataformas, mas também por todos os elos que compõem a cadeia produtiva do audiovisual.
Diferenciar-se vai muito além de simplesmente fazer de outro modo aquilo que os demais já fazem. Trata-se de inovar em todo o fluxo de trabalho, mas sem perder de vista a responsabilidade com o orçamento e, principalmente, o posicionamento de mercado pretendido. Afinal, diferenciação exige, antes de tudo, um propósito claro. Nada pode ser feito à toa.
Para se chegar a esse diferencial (ou conjunto de diferenciais), a empresa precisa obrigatoriamente passar por uma profunda análise interna. Por se tratar de um processo complexo, por vezes até doloroso, recomenda-se fortemente o apoio de um consultor externo. Ele deverá orientar o trabalho junto aos sócios e demais integrantes da equipe, além de aportar informações de mercado. Ao final, deve ser escolhida a demanda (ou as demandas) que o negócio atenderá e de que forma esse atendimento se dará. O ideal é que essa forma seja única.
Ser única permite que a empresa fuja de comparações potencialmente desfavoráveis. Segue um exemplo. Certa plataforma oferece um catálogo quase infinito, repleto de blockbusters, por 30 reais ao mês. Já outra plataforma oferece de um catálogo bem menor, mas com ótimos e exclusivos conteúdos infantis combinados com ebooks e jogos, por 15 reais mensais. Se a comparação se restringir ao preço, a primeira opção seria, em termos relativos, mais vantajosa, pois entrega mais conteúdo. Entretanto, uma pessoa que tenha profundo interesse em conteúdos infantis talvez decida assinar a segunda plataforma, ainda que, para enriquecer suas horas de lazer, resolva assinar também a primeira opção e, assim, acabe gastando mais com vídeo sob demanda.
A diferenciação, portanto, torna possível tanto a construção de uma clientela fiel, diretamente interessada naquilo que a empresa oferece, quanto a conquista daqueles que até gastariam com a concorrência, mas enxergam o produto ou serviço de nicho como um complemento ideal. Considerando o atual momento do mercado de VOD, cheio de players, não há outro caminho que não o da especialização. Foi o que aconteceu há meio século atrás no rádio, quando surgiu a banda FM e o número de emissoras no ar praticamente dobrou. É o que acontece há décadas na TV por assinatura, com suas centenas de canais.
Em suma: para sobreviver no mundo do streaming, é preciso se conhecer, escolher o público que deseja atender e, finalmente, atendê-lo de forma única. Antes de querer abraçar o mundo, é preciso agarrar quem se pode (ou se deseja) alcançar.
Links indicados ao longo do texto:
2- https://www.comscore.com/por/Insights/Blog/O-mercado-de-OTT-Video-Content-no-Brasil
3- https://labsnews.com/en/news/technology/disney-plus-surpass-netflix-20206-says-digital-tv-research/
4- https://twitter.com/miguelsmirnoff/status/1379023073307934722
Fernando Morgado
Consultor e palestrante de marketing e inteligência de mercado. Já atuou para empresas como B2W, Band, Globo e SBT. Professor das Faculdades Integradas Hélio Alonso. Professor convidado de instituições nacionais e estrangeiras. Autor de vários livros publicados no Brasil e no exterior, incluindo o best-seller Silvio Santos - A Trajetória do Mito. Membro da Television Academy, entidade organizadora dos prêmios Emmy. Foi coordenador adjunto do Núcleo de Estudos de Rádio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mestre em Gestão da Economia Criativa e especialista em Gestão Empresarial e Marketing pela ESPM.
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