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Artigo / Inclusão

23 Março 2021

Presença feminina no Oscar 2021

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Algo inédito aconteceu este ano nas indicações da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas Americana. Nas indicações ao mais destacado prêmio do mundo do cinema aconteceu, pela primeira vez em 93 anos de premiações, a indicação de duas mulheres ao prêmio de melhor direção. Parece absurdo pensar que essa situação nunca tenha acontecido, mas essa é verdade.

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Emerald Fennell, diretora de Bela Vingança e Chloé Zhao, diretora de Nomadland, concorrem ao prêmio que acontece em 25 de abril. A quebra de mais esse tabu nas premiações da academia merece ser reconhecida. Esse ano também acontecem outras situações singulares. Frances McDormand é a primeira mulher a disputar como atriz e produtora no mesmo ano e pelo mesmo filme, sendo essa dupla indicação também um feito inédito. Assim como a primeira indicação na categoria Cabelo e Maquiagem para uma dupla de mulheres negras — Jamika Wilson e Mia Neal —, que concorrem por A Voz Suprema do Blues, filme pelo qual concorre como melhor atriz Viola Davis, em sua quarta indicação ao prêmio, o que a torna a atriz negra com mais indicações na história da academia.

Voltando a Chloé Zhao, ela também é a primeira mulher não branca a receber a indicação a melhor direção. Zhao é chinesa. Vamos lembrar que até 2020 somente cinco mulheres foram indicadas a esse prêmio, somando-se todas as edições. Apenas uma mulher venceu na categoria — a diretora de Guerra ao Terror Kathryn Bigelow no ano de 2010. E o ineditismo sobre a figura de Zhao continua, pois ela recebeu ainda este ano indicações nas categorias de roteiro adaptado, montagem e melhor filme, dessa forma se torna a realizadora mulher com mais indicações em um mesmo ano.

Esses são os grandes destaques da edição de premiação desse ano. Mas as mulheres nunca estiveram tão presentes entre os indicados. Ao todo, são 78 indicações para 72 mulheres diferentes (algumas indicadas a mais de um prêmio, como vimos). E sim é preciso celebrar o aumento da presença feminina. Compreendendo que esse aumento não está acontecendo espontaneamente, o crescimento é fruto de uma política de diversidade que a própria academia vem adotando desde 2015, ampliando em seu quadro de componentes votantes a participação de mulheres, profissionais não brancos e profissionais estrangeiros, em busca de uma maior diversidade. Esse movimento de diversificação de seu próprio corpo de integrantes, responde a uma pressão social forte e faz com a escolha dos indicados também evolua para uma condição um pouco mais diversa. Ocorre uma abertura maior para concorrentes que até pouco tempo atrás jamais seriam considerados para receber indicação aos prêmios da academia.

A importância de haver mais diversidade na premiação de maior destaque no mundo do audiovisual é a possibilidade de desdobramentos para outros prêmios, para o mercado de exibição e para um reconhecimento por parte do próprio público. Há bem pouco tempo soava muito normal que o prêmio fosse nomeado aqui no Brasil, e provavelmente em outros lugares do mundo também, como prêmio para o “melhor diretor” e não como prêmio de “melhor direção”. É uma diferença aparentemente sutil, mas que revela um mundo de machismo e falta de acesso que as profissionais mulheres enfrentaram e ainda enfrentam. No entanto, hoje as demandas sociais exigem uma reflexão crítica sobre a situação das profissionais mulheres.

O aumento da presença feminina no mundo do audiovisual é evidente, mas ainda precisa ser amplificada para que seja possível a equivalência entre profissionais homens e mulheres. Para que os cargos de decisão criativa, de decisão financeira e técnicas sejam ocupados com paridade. Essa possibilidade só será alcançada com um árduo trabalho de inclusão, de defesa dos direitos das mulheres, de abertura de oportunidades. Tais articulações passam por ações concretas que promovam a atividade de criação, produção e exibição no mercado audiovisual voltadas ao aumento da presença feminina.

Vale notar que essa movimentação se reflete no conteúdo que é disponibilizado. Quanto maior a diversidade em todas as etapas de desenvolvimento de um produto audiovisual, maior a diversidade de forma e conteúdo nos produtos audiovisuais. Maiores as chances de serem desenvolvidos personagens fortes e complexos dentro de uma gama de diversidade, assim como são maiores as chances de termos narrativas mais amplas, ricas e menos estereotipadas.

Nós existimos em diversidade e é muito cruel que no campo de representação do simbólico nossas opções ainda sejam restritas. Lutamos por representatividade e equidade nas telas do audiovisual e para chegar a isso o caminho passa por uma movimentação estratégica e clara por tudo o que acontece no processo de criação e realização de nossas obras audiovisuais.

Lyara Oliveira
Lyara Oliveira

Criadora, produtora e diretora de conteúdo audiovisual e de experiências imersivas, professora e pesquisadora. Mestra em Artes Visuais. Doutoranda na ECA/USP em Meios e Processos Audiovisuais. Atualmente é Diretora de Desenvolvimento e Políticas do Audiovisual da Spcine e leciona na ESPM. Foi conselheira e gestora na APAN-Associação dos Profissionais do Audiovisual Negro.

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