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Artigo / Cinema

09 Dezembro 2020

Os cinemas merecem...

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Os Cinemas merecem respeito e consideração, e merecem manter-se como a melhor alternativa de lazer e cultura, não só por transportar nossos olhos, ouvidos e mentes no espaço e no tempo, a lugares, épocas e ideias extraordinárias, mas principalmente por serem um negócio de valor comercial e artístico importante.

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Os Cinemas exibem a produção intelectual e técnica de milhares, talvez milhões de artistas e profissionais ao redor do mundo, que criam, estudam, realizam e produzem filmes e conteúdos maravilhosos, com talento e muito, muito trabalho. Mostram esse trabalho para bilhões de pessoas todos os anos.

Histórias cada vez mais complexas e criativas, utilizando equipamentos e soluções em constante desenvolvimento, aos quais não teríamos acesso se não fosse pela criatividade, esforço e talento dessas pessoas. 

Não estou falando da tal “magia do Cinema”, do momento “mágico” em que nos vemos diante de uma tela grande, cercado de estranhos para compartilhar uma experiencia. Estou falando de 40 bilhões de dólares gerados anualmente pelo setor, e pelos efeitos que uma carreira vitoriosa nos Cinemas gera para toda a cadeia de valor dos produtos audiovisuais.

Estou falando de dinheiro e imagem.

A WarnerMedia anunciou que vai lançar suas produções simultaneamente nos Cinemas e na sua plataforma HBO+ em 2021. Essa ação pode representar o final do setor de Cinema como conhecemos, e com ele o final também de inúmeras produções feitas com coragem, carinho e talento, já que o mercado de Cinema pode encolher significativamente nessa nova modalidade.

Do ponto de vista competitivo, dá para entender a posição da WM; o segmento de streaming é o futuro em termos de volume, margens e relacionamento com os consumidores. Esse movimento reforça o conceito da eliminação dos intermediários, conhecido como direct-to-consumer, possibilita melhor conhecimento dos gostos e preferencias dos consumidores e gera maior possibilidade de influir em seus hábitos de consumo e na fidelidade aos novos produtos e serviços.

Ainda, pode não haver espaço e margens para muitos participantes nessa categoria, dominada pela Netflix e pela Disney, portanto, ser uma das três forças dominantes do mercado de streaming o mais rapidamente possível poderá garantir à WM um lugar privilegiado no futuro da categoria. Agilidade, também aqui, é importante para garantir posição de destaque.

Do ponto de vista meramente financeiro, fica claro que a opção da WM se justifica pelo investimento feito pela empresa-mãe AT&T na aquisição da WM, e precisa mostrar resultados aos seus acionistas.

Há porem outros pontos a serem considerados nessa decisão.

Ao desacreditar o Cinema como primeira mídia a exibir um conteúdo, as empresas terão que abrir mão de parte substancial do faturamento, à medida que a audiência reduza suas idas aos Cinemas. Haverá também queda nos níveis de antecipação, de expectativa, e da geração de percepção de valor de marca para os conteúdos. Os filmes exibidos em Cinema geralmente recebem campanhas adequadas ao retorno esperado, e essas campanhas ajudam na criação de valor para as marcas, valor este que se estende para todas as demais mídias onde o conteúdo é exibido. Sem a ajuda dessa mídia, dificilmente as empresas produtoras e distribuidoras investirão orçamentos gigantes na promoção de seus conteúdos, reduzindo o volume e a intensidade de suas campanhas de lançamento.

Cinema é experiencia, e experiencia envolve tempo. Tempo não pode ser guardado, portanto aquela oportunidade de um lançamento próximo a um feriado, às férias de verão ou inverno, a premiações, tudo será reduzido e boa parte dos ganhos que poderiam advir desses elementos será descontado do que poderia ser obtido se mantida a exibição em Cinema.

Falar que os Cinemas estão com problemas e correm o risco de fechar ou reduzir suas atividades não ajuda na discussão; os Cinemas não são exceção e têm sido duramente atingidos pelos efeitos da pandemia. Têm problemas de ocupação e retorno sobre o investimento, e o setor precisa mesmo de ajustes e correções de operação e comunicação com os clientes e espectadores.

Agora, julgar o movimento recente de lançamentos simultâneos pela ótica de prejuízo a um setor com problemas é ver a situação com miopia, e sem entendimento do real cenário que será gerado se a recente decisão for confirmada.

Os estúdios investem bilhões de dólares anualmente em produção e marketing para seus produtos; se o faturamento de uma importante área do negócio for reduzida, pode não haver investimento que justifique o desenvolvimento de tecnologias e inovações técnicas; roteiros, efeitos, som, imagem e profundidade da experiencia, talentos, experiências e historias serão perdidos, ou pelo menos, não irão se desenvolver na mesma velocidade que tem sido verificada nos últimos anos.

O evento, o momento, aquele lançamento espetacular, ansiado por todos, poderá não mais vai ocorrer; afinal, pode-se ver o mesmo conteúdo em casa, sem correria e sem atropelos, certo?

O fortalecimento do streaming e suas qualidades maravilhosas deve passar pela desidratação do segmento que hoje representa 40 bilhões de dólares por ano?

É isso mesmo? É isso o que queremos?

Teremos muito o que pensar e fazer em 2021.

Marcos Oliveira
Marcos Oliveira

Marcos Oliveira é Consultor Especial do setor de Produção e Distribuição de Conteúdo Audiovisual, através de sua empresa Leverá Conteúdo e Negócios, que atua em desenvolvimento de projetos, captação, distribuição e consultoria. Sua carreira profissional inclui atividades em posições de liderança em empresas como Johnson & Johnson, Twentieth Century Fox Brasil e Austrália, Warner Bros e Universal Pictures.

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