09 Novembro 2020
Economia da Cultura e do Audiovisual: a importância dos dados
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Ainda que determinados aspectos da indústria criativa ocupem um papel cada vez mais central na discussão econômica global, como as regulamentações sobre propriedade intelectual, o fato é que as indústrias criativas ainda são insuficientemente estudadas em seus aspectos econômicos nos países em desenvolvimento.
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Indicadores culturais são capazes de descrever a realidade cultural e um Painel de Dados, então, torna-se um importante recurso de análise e planejamento, propondo uma abordagem pragmática para governos, permitindo que passem a atuar de maneira mais eficaz e eficiente, através de ações planejadas.
Importante contribuição, nesse sentido, foi feita em 2020, através da criação do Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural, uma ferramenta que traz um panorama econômico dos setores cultural e criativo brasileiros nas vertentes “Mercado de Trabalho e Empreendimentos” – que reúne conteúdos relacionados aos trabalhadores e aos setores culturais e criativos, tendo como base a metodologia da intensidade criativa; “Financiamento Público à Cultura” – que exibe informações sobre financiamento público federal à cultura por diferentes mecanismos, além de informações sobre os orçamentos públicos federal, estadual e municipal da cultura e “Comércio Internacional de Produtos e Serviços Criativos”, que traz dados sobre o comércio internacional de bens e serviços ligados aos setores culturais e criativos e busca dimensionar o dinamismo do processo de internacionalização da cultura.
A partir dos dados relacionados aos investimentos públicos no setor cultural, apresentados pelo Painel, foi possível que os pesquisadores envolvidos na iniciativa analisassem o impacto da Lei 14.017/2020 (Lei Aldir Blanc) nos orçamentos da cultura, nas capitais, estados e Distrito Federal, em comparação às dotações orçamentárias de 2017 a 2020, permitindo, assim, a visualização dos valores que foram incrementados aos orçamentos próprios.
Segundo o Relatório “Dez anos de Economia da Cultura no Brasil e os Impactos da Covid-19: um relatório a partir do painel de dados do observatório Itaú Cultural” (Itaú Cultural, 2020), a soma dos repasses previstos pela Lei Aldir Blanc totaliza, aproximadamente, 1,8 bilhão de reais, sendo 1,5 bilhão de reais para os estados e cerca de 300 milhões de reais para as capitais.
Em relação à equivalência do repasse da Lei Aldir Blanc e às dotações orçamentárias, observa-se que 37% dos estados receberão repasse maior que sua dotação orçamentária para 2020 – com metade deles podendo somar mais que o dobro de seu orçamento.
Ainda, segundo o Relatório, para 40% dos estados, esse recurso externo ao orçamento da cultura, via Lei Aldir Blanc, tende a ser multiplicado de três a dezoito vezes ao que já foi aplicado com recurso próprio – quando se leva em consideração a previsão de repasse em relação ao valor executado no primeiro semestre de 2020 por estados e capitais.
O modelo de cogestão entre os entes federativos adotado pela Lei Aldir Blanc já vinha sendo praticado nas políticas para o audiovisual, na medida em que 30% de todo o fundo setorial era obrigatoriamente destinado às regiões norte, nordeste e centro-oeste, e 10% para a região sul, Minas Gerais e Espírito Santo.
Assim, ainda que determinados segmentos da economia criativa brasileira e regiões do país serão positivamente impactados pela Lei Aldir Blanc, a relevância do auxílio para o setor audiovisual será diminuta, em virtude de uma fragilização que se iniciou com a forte crise institucional do setor, e que se aprofundou com a paralisação das produções, impedimento do funcionamento de salas de cinema e inviabilização do lançamento das obras produzidas.
O Brasil é um grande mercado consumidor de audiovisual, e historicamente foi cobiçado por grandes players internacionais por seu potencial como consumidor. A economia do audiovisual é uma economia central no mundo contemporâneo, e os lobbies estrangeiros da indústria global – com ou sem pandemia - continuam avançando na ocupação monopolística dos mercados, enquanto o que se vê no país é a desorganização do aparato regulatório que impulsionou os grandes avanços dos últimos dez anos, que favoreceu empresas, produtores e a indústria audiovisual brasileira.
Alessandra Meleiro
Pós-doutorado junto à University of London e Professora do Bacharelado em Imagem e Som da Universidade Federal de São Carlos. Presidente do IC – Instituto das Indústrias Criativas, membro da UNCTAD/ONU. Foi Presidente do FORCINE entre 2016-2020. Autora de 09 livros sobre cinema mundial, políticas e indústria audiovisual. Atuou como Research Fellow na Dinamarca junto à Aarhus University (2014-2018) e VIA University/ School of Business, Technology and Creative Industries (2020) e como Consultora de empresas como Netflix Brasil, Itaú Cultural, Anima Mundi/JLeiva, dentre outras.
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